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AMOR PARA NUNCA ESQUECER


Publicado no Jornal da Cidade Online, em 30 mai 2010

O primeiro dia de qualquer ano geralmente é reservado para o descanso. Se não foi realizado ainda, fazemos o balanço do ano que acabou e as projeções para o bebê que nasceu à meia-noite. Mas para Genuíno Ferri e Wanda Scarello Ferri a data marcou o início de uma longa história de amor. Os dois casavam no dia 1º de janeiro de 1949. Hoje, com 87 e 83 anos, respectivamente, ambos protagonizam uma história ainda mais linda que aquela do fim da década de 40. Wanda possui a doença de Alzheimer e com o passar dos dias, sua memória fica cada vez mais fraca. No intuito de fazer com que a esposa não esqueça os momentos passados juntos, seu esposo decidiu escrever a história de ambos em forma de romance.
A reportagem foi feita pelo jornal Zero Hora, publicada no dia 23 de janeiro de 2010. Mas fiquei sabendo não por abrir o jornal e deparar-me com a história de Genuíno, ou Seu Gino como é conhecido. Uma amiga mandou-me um e-mail comentando sobre a história romanceada de Gino e Wanda: “A história me encantou. Lê, tenho certeza que vai te inspirar uma nova crônica”. Com certeza inspiraria qualquer um a divagar sobre o amor, a filosofar sobre o casamento, a olhar para a sua amada e pensar, puxa, isso é que é prova de amor...
E Gino não é nenhum super-homem. Mas é um escritor. E isso já lhe facilita escrever sobre a longa caminhada do casal. Os dois moram em Encantado, nada mais sugestivo. São poucas as pessoas que têm condições de concretizar um feito desses. Porque é difícil haver um casamento que dure tanto. Geralmente as histórias de amor têm sido no prazo de meses ou poucos anos. Ou então, um dos dois já faleceu. São 61 anos de casamento, de cumplicidade. Não é pouco, não.
Lendo a reportagem recordei de meu bisavô, falecido em junho de 2008, após 91 anos de vida. Eu estava viajando a trabalho e não tive como ir ao seu velório. Mas assim que pude fui a sua cidade e tratei de ver minha bisavó, que ficava sozinha no mundo após 69 anos de casamento. Conversava com ela e por vezes não era reconhecido. Ela logo retomava o fio da meada e conversava normalmente. Fiquei tão triste quando ouvi essas palavras: “O meu velhinho se foi e eu fiquei aqui, sozinha”. Ao mesmo tempo achei incrível a cumplicidade que tinham, maravilhoso o amor entre os dois. Estava desamparada. Por mais que os filhos estejam com ela, lhe auxiliem nas atividades que agora são um tanto trabalhosas, ela não possui mais o espelho da sua alma, aquele senhor que a ouvia com paciência e chorava junto. Não digo que a relação dos dois sempre foi de rosas. Mas se existiu até então, é porque algum valor havia.
Pode ser que essa não tenha sido a primeira vez que alguém decidiu documentar a história para seu amor porque ele não se lembraria mais tarde do ocorrido. Não conheço nenhuma histórias dessas que seja real, antes do Seu Gino. Mas o cinema já dera a ideia antes, com o Como se fosse a primeira vez, com Drew Barrymore e Adam Sandler. Ela possuía uma doença que a fazia esquecer tudo o que ocorrera consigo após levantar-se no dia seguinte. E para mantê-la apaixonada e sabedora do amor entre os dois, ele decidiu filmá-los. Era uma conquista diária. Uma difícil arte de conquistar a cada amanhecer.
Wanda não está numa situação tão crítica quanto a personagem de Drew. Mas ao ler o romance de Gino, se manterá apaixonada da mesma forma. Em vida, meu bisavô talvez nem soubesse direito o que era um romance. Mas ambos viveram história tão bela quanto a noticiada. O diferencial é que Seu Gino pôde eternizar tudo o que passou e ultrapassou a simples questão de fazer sua esposa recordar as histórias dos dois. Ele fez uma homenagem a Wanda e todos que contracenaram na história do casal e que lerem o livro serão testemunhas disso.

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