sábado, 28 de maio de 2011

A dita fala "errada"

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 29 de maio de 2011.

“Os livro ilustrado mais interessante estão emprestado”. Esta frase tornou-se hit em jornais, telejornais, rádios e na internet depois que o MEC publicou o livro “Por uma vida melhor”, destinado à Educação de Jovens e Adultos. Você, certamente, condena que escrevam dessa maneira. Mas, sem sombra de dúvidas, já falou assim ou parecido. Não consigo imaginar alguém, até mesmo aqueles gramáticos mais conservadores, falando “se vós soubésseis” à mesa, num estádio de futebol ou no barzinho com os amigos no happy hour (segundo o deputado Raul Carrion, 'numa hora feliz'). Da mesma forma que ninguém seria louco de palestrar num seminário falando “e aí, pessoal, vim aqui dá um lero proceis”.

Esse debate formado acerca do falar certo/adequado ou errado/inadequado é muito interessante. Saem mais maduros do confronto de ideias os pró-livro do MEC e aqueles que são contra. E isso é ótimo. O que desagrada é perceber a quantia de informações desencontradas sobre esse assunto. O Jornal Nacional noticiou, na abertura da sua edição do dia 13 de maio, que o livro do MEC estaria “sinalizando nova classificação quanto ao uso da língua portuguesa”, deixando de encará-la como certa ou errada, passando a ser vista como adequada ou inadequada. Contudo, a fala já é compreendida como adequada ou inadequada por sociolinguistas há muito tempo.
Também se fala que a cartilha reza que escrevendo corretamente ou errado, tudo será encarado como certo. Isso não está no livro. Há muita gente que pega a informação no ar e já repassa, sem conferir a veracidade. Essas afirmações infundadas sobre o “Por uma vida melhor” são preocupantes.
A todo o momento fazemos construções de frases que, analisadas a fundo, agridem as normas gramaticais. Se estamos entre amigos, tampouco nos preocupamos quanto ao uso de gírias, comemos o “s” do final das palavras, cortamos o enunciado pela metade e concluímos o pensamento com um gesto. Conseguimos nos fazer entender? Claro, sem sombra de dúvidas. Vamos falar da mesma maneira numa entrevista para emprego? Lógico que não. E por quê? Por estarmos numa situação comunicacional totalmente diferente.

A escrita segue uma estrutura fixa, complexa e que não consegue atingir a fala. Porque quando falamos, a gesticulação e as feições faciais interferem muito na compreensão do que é dito. Já na escrita, não. Não tem cara de espanto no texto; no máximo, uma “exclamação”. E o que está impresso pode ser lido tanto em Porto Alegre quanto em Maceió, ao mesmo tempo ou em datas separadas. Daí a importância de se escrever uniformemente, de acordo com regras estanques.

Disso, pode-se depreender que não escrevemos da mesma maneira que falamos. A Semana da Arte Moderna, em 1922, rompeu com a literatura vigente e buscou aproximar-se mais da fala, da realidade. Mas essa “licença poética” dos modernistas do início do século passado servia apenas para romper barreiras de estética, de pensamento. Jamais se intencionou falar e escrever da mesma forma.

Não podemos negar toda a história de vida de quem não teve a oportunidade de estudar quando mais novo e que fala totalmente em desacordo com as normas gramaticais. Precisamos aceitar que a variação linguística utilizada por esses jovens e adultos que retornam aos bancos escolares depois de anos é uma maneira de comunicação. Não se trata de apologia, e sim, de aceitação. Negar esses dialetos seria como tapar o sol com a peneira, confabulando que esses cidadãos sempre falaram escorreitamente.

É papel inegável da escola possibilitar o acesso à forma de prestígio da língua. Se a língua é poder, aprender os meandres gramaticais dela é uma das maneiras de ascensão social que a escola propicia a seus alunos. Mas tudo isso, sem lhes negar a realidade da própria fala. Sem lhes negar quem são.

domingo, 22 de maio de 2011

Um cara chato

Destaque no 3º Concurso Literário Farroupilha 2011, categoria poesia


o passado


deu um oizinho hoje pela manhã


dei tchau


mas ele encontrou-me novamente.


que cara chato.


que nunca vai embora.


que jamais irá.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Pessoal,

se moram em Santiago ou pertinho de lá...
e mesmo para aqueles que vivem longeee...

Não percam a II SEMANA LITERÁRIA DE SANTIAGO, de 8 a 11 de junho, organizada pela Casa do Poeta de Santiago (grande abraço ao presidente Márcio Brasil), em parceria com a Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Santiago e o Projeto Santiago do Boqueirão, seus poetas quem são?
Dentre outras coisas, vai falar sobre o Caio Fernando Abreu e o Oracy Dornelles.

Confere aí no blog do Giovani Pasini:

http://www.giovanipasini.com/2011/05/ii-semana-literaria-de-santiago.html

domingo, 15 de maio de 2011

Troque um Bolsonaro por 354 professores

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 15 de maio de 2011.
Quando decidi fazer o curso de Letras, definitivamente, não tive a aspiração de ser rico. Quiçá de viver bem, com um bom padrão de vida, pois o início da carreira de professor com graduação é um tanto doloroso. Os pouco mais de 500 reais mensais pelas 20 horas semanais de aula propostos pelos editais de muitos concursos a professor da rede municipal no Rio Grande do Sul não pagam a mensalidade de outrora da faculdade.

Onde está o retorno financeiro? Aparece apenas aos poucos que logram um curso de mestrado e ingressam na docência universitária. E olha que, ainda assim, não dá para esbanjar. A grande massa fica apenas com a graduação. Não por escolha, mas por que o bolso é pequeno e não há viabilidade para pagar um curso de maior duração e que, fatalmente, demande mais investimentos financeiros.

O que fazemos com os benditos mil reais para oito horas diárias de trabalho? Antes mesmo do aperfeiçoamento profissional, algumas contas brigam entre si para serem pagas. É aluguel, água, luz, condomínio, IPTU, telefone, rancho, os gastos com passagem (porque o meio de transporte é o ônibus, lógico), e outras despesas inevitáveis para a sobrevivência. Que professor terá condições de investir todo o pouco que resta do capital numa assinatura de revista que desequilibra o orçamento? Não esqueçamos que livros didáticos também não são nem um pouco baratos...

A assinatura anual da revista Nova Escola atinge a cifra de R$ 37,00. Uma revista, definitivamente, feita para os professores. Barata. Porque a National Geographic Brasil custa anualmente R$ 179,88. Aventuras na História, R$ 131,40.

E para assinar uma revista semanária como a Veja, os padrões do professorado indicam, visivelmente, que a solução é fazer um “racha” com os demais colegas da escola e deixar a revista exposta na sala dos professores. Leitura apenas nos intervalos ou após o término das aulas. Quem se interessar por algum assunto, tira uma fotocópia e lê com calma em casa. O valor anual da assinatura? R$ 462,78. Comprando a revista avulsa, o custo anual sobe para R$ 694,20. É um aumento percentual que seria muito bem-vindo no contracheque.

Isso me faz ter mais fé na teoria de que o professor foi moldado por Deus e trazido pela cegonha para viver em comunidade. Porque ele é alguém que não consegue viver sozinho. Necessita estar rodeado de alunos perguntando-lhe, sanando dúvidas, pedindo para ir ao banheiro, implorando para adiar a prova, querendo que a aula seja mais light. Esse ser, indubitavelmente, foi fabricado para viver em grupo. O professor necessita viver com outros, muitos outros seres semelhantes, porque senão, vai à falência.

É mentira que querem uma educação melhor. Gente culta não veste involuntariamente a camiseta de massa de manobra. Gente que consegue subir um pouco mais nos degraus escolares não aceita suborno de candidato a deputado ou vereador por necessidade orgânica de alimentar-se. Aceita por opção, pura falta de caráter.

Em contrapartida, deve-se fazer uma mea culpa: há graves erros na administração de escolas, no repasses de verbas, nos currículos escolares obsoletos, ultrapassados. E há formações familiares precárias que refletem em alunos de difícil relacionamento.

O Juremir Machado escreveu a crônica “Complicada complexidade”, dia 18 de abril, no jornal Correio do Povo, falando que problemas complexos não se resolvem com soluções simples, e sim, com soluções complexas. Seria leviano, realmente, dizer que melhorando o salário do professor o problema educacional estaria resolvido. Quem dera... O reajuste salarial não é a única solução, mas é por ele que as respostas devem passar.

Fica claro que o descaso do Estado com o ensino é motivado pela falta de resultados imediatos. Eles aparecem significativamente depois de anos. A verba que vai para escolas e professores não retorna num primeiro momento, no mesmo mandato. As mudanças são graduais, lentas e dependem do sucesso de todos os fatores.

Estou cada vez mais convicto de que a campanha “troque um deputado por 354 professores” é uma das máximas contemporâneas de maior relevância. Esse cálculo realizado e que circula pela internet contabiliza o salário “mixuruca” dos parlamentares, somado aos vale-passagem aérea, vale-assessor, vale-telefone, vale-tudo que o cargo proporciona, e dá conta dos vencimentos de 354 professores.

Li essa frase há certo tempo, numa corrente recebida por e-mail. Ela também apareceu, numa versão mais atualizada, entre estudantes das Etecs (Escolas Técnicas) e Fatecs (Faculdades de Tecnologia) de São Paulo, que protestaram por reajuste salarial nessa sexta-feira, 13 de maio. Sabiamente, dizia “troque um Bolsonaro por 354 professores”. Uma troca onde o custo-benefício compensa.

sábado, 14 de maio de 2011

Tem vereador defendendo a compra milionária de veículos no Rio de Janeiro, argumentando que não possui carro particular.
Realmente... ele anda a pé/metrô e o povo de Rolls-Royce.

domingo, 1 de maio de 2011

Macaquices na língua portuguesa

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 1º de maio de 2011.

É DIFÍCIL FALAR SOBRE APROVAÇÃO DE LEIS na semana em que o príncipe William e a plebeia Kate Middleton casaram-se. Realmente, torna-se supérfluo falar de uma lei idiota, quando ouvidos e -principalmente!- olhos estão voltados aos detalhes importantíssimos do casamento do ano. Aliás, do século, da história, da galáxia...

Desligando um pouco a mente da Meca do consumismo e do culto às tradições, ressalto a brilhantíssima ideia do deputado estadual do Rio Grande do Sul, Raul Carrion em votar pela “Abolição dos Estrangeirismos”. Se 1888 foi marcado como o ano da assinatura da Lei Áurea, que aboliu a escravidão, 2011 fixa-se na história gaúcha como o ano em que deixamos de falar mouse e passamos a dizer rato e que saímos do trabalho para fazer uma hora feliz.

Este projeto de lei nasce da necessidade de resguardar a língua portuguesa da invasão indiscriminada e desnecessária de expressões estrangeiras que possuem equivalentes em nosso idioma”, escancarou Carrion em seu site. Esse mesmo senhor que defende o neocolonialismo linguístico, aprovou em 2008 a Semana Estadual do Hip Hop.

O deputado salientou na defesa do seu projeto que o uso de estrangeirismos é "imposição cultural por macaquice". Então, como ele explica a Semana do Hip Hop, através da Lei 13.043, de 30 de setembro de 2008? Evidencia-se a incoerência no discurso retrógrado do deputado, exigindo que termos estrangeiros, dicionarizados, devam ser traduzidos para o português.

Inevitável não o comparar com Policarpo Quaresma, numa versão contemporânea. Enquanto o personagem desmiolado de Lima Barreto lutou até o fim pelo nacionalismo da língua, Carrion também acredita desoportunadamente que devemos falar o português literário e escorreito, tão inatingível quanto as virgens do ultrarromantismo literário. Essa decisão acéfala, infelizmente, recebeu apoio de um quórum de 26 parlamentares. Os outros 24 deputados utilizaram a massa encefálica e votaram contra.

Ora, se estamos em busca de uma língua nacionalista, por que não falamos o tupi-guarani? Uma vez que o nosso português brasileiro tem origem no português de Portugal, evidencia-se que não estamos, efetivamente, buscando as raízes de nosso povo.

Vou dar algumas sugestões ao parlamentar: poderia acrescentar na lei que aprendêssemos o português de 1500, de quando os portugueses chegaram ao Brasil. Ou o latim, origem da nossa língua. Melhor ainda, poderíamos falar a língua indígena, afinal, foram os índios os primeiros habitantes do Brasil.

Esses palpiteiros que procuram instituir algo para promover-se, deveriam expandir o debate à população. Não tenho dúvida de que se houvesse uma discussão do projeto de lei com a sociedade antes de votá-lo, o resultado não seria a aprovação. Opinar é uma coisa, achismo é outra bem diferente.

É lamentável quando pessoas que não têm formação mínima para opinar sobre um assunto e sequer informam-se acerca do mesmo, profanam tolices como o deputado Carrion. Isso me faz lembrar uma observação da profª Dra. Stella Maris Bortoni-Ricardo, em seu livro “Nós cheguemu na escola, e agora?”. Ela citou um artigo do profº José Carlos Azevedo, Ph.D. em Física, onde ele considerava errada a construção “Toda criança na escola”, adotada como slogan do Ministério da Educação em 2005. Orientava a adoção de “Todas as crianças na escola”.

Stella Maris esclareceu que ambos os empregos estão corretos. Finalizou a análise com uma frase que pode ser perfeitamente estendida ao Sr. Carrion: “[...] convém observar que se os Ph.D's em Física começarem a concluir entre seus misteres o de dirimirem dúvidas no uso do português, o governo brasileiro pode começar a economizar os recursos que despende para formar Ph.D's em Letras e Linguística”. Não se trata de “macaquice”, como relatou Carrion, e sim, de cada macaco no seu galho.

domingo, 24 de abril de 2011

ANNA JULIA, LOS HERMANOS

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 24 de abril de 2011.


ESTAVA LEVANDO MINHA IRMÃ NUMA AMIGA e eis que ocorre uma situação interessante. O rádio do carro tocou uma música que se costuma dizer, foi “desenterrada” da memória, cavoucada até os grotões da lembrança e lançada ao ar. Gente, quanto tempo faz que estourou nas rádios esta música? Mano, muito tempo, credo! Anna Julia, música emblemática dos Los Hermanos, de 1999, idos doze anos atrás. Mesmo sem ouvi-la há alguns, em uníssono, acompanhamos a letra, admirados por ainda recordarmos quase perfeitamente toda a composição.


Um misto de sensações passou na minha mente. Vieram à tona lembranças boas e ruins. Daquele eu de dez anos atrás. Com minhas apreensões de dez anos atrás. A mentalidade da época. Os problemas que eu tinha e que hoje até esquecera que um dia convivera com eles.


Quando uma música nos marca, anos depois ela traz-nos uma doce melancolia que gera risos e choros. Lembramo-nos mais jovens e dos fatos contemporâneos à música que mexeram com nossas emoções.


Quantos relacionamentos foram lamentados sob o fundo de Anna Julia? Uma trilha sonora de corações partidos e mesmo de jovens imberbes à procura do primeiro amor, que buscavam nessa e em tantas outras canções juvenis um bálsamo para a sua solteirice.


Sim, havia pessoas que não gostavam de Anna Julia. Conheci poucas, muito poucas, mas existiam bem mais. Há ainda, aquelas que inicialmente não gostavam do single, mas com o tempo simpatizaram. Isso devido à excessiva exposição da música na rádio e televisão.


Quando ouvimos constantemente uma música, em distintos momentos, mesmo que não gostemos, passamos a associá-la às sensações que sentimos enquanto é executada. Dessa forma, aquela sonoridade que era indigesta transforma-se numa amigável música. Isso deve ter ocorrido com um antipatizante dos Los Hermanos que a ouviu no mesmo momento que recebeu a notícia que seria pai e em homenagem, sua filha recebeu o nome de Anna Julia.


A música tem esse poder. Essa magnífica força de mover-nos para mais à frente, motivando-nos e, com a mesma intensidade, reforçar o sentimento depressivo que possamos estar sentindo. Ela embala todas as idades. O bebê no seu sono inocente. A adolescente no namorisco com o amigo. O adulto, o idoso. Da mesma maneira que Anna Julia embalou-me anos atrás e novas músicas embalam, hoje, outros jovens como eu.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Por dois votos, Assembleia aprova projeto que exige tradução de palavras estrangeiras

O deputado Raul Carrion projeta-se no cenário político como o mais novo Policarpo Quaresma, ardoroso defensor do purismo linguístico. O triste é que sua ideia pinel encontrou eco na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. Deveria preocupar-se em votar projetos decentes e deixar que a língua portuguesa desenvolva-se como é o natural da evolução da linguagem!!!

ACESSE O LINK DA REPORTAGEM:
http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default.jsp?uf=1&local=1&section=Pol%EDtica&newsID=a3280229.xml

domingo, 17 de abril de 2011

É só uma piadinha inocente

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 17 de abril de 2011.


NA QUINTA-FEIRA, 7 DE ABRIL, PRESENCIAMOS UMA CHACINA numa escola de Realengo, no Rio de Janeiro. Acontecimento lamentável. Muito triste. No dia seguinte, parte da torcida do Sada Cruzeiro, equipe de voleibol de Araçatuba – SP, bradava em coro “bicha, bicha, bicha!” enquanto o meia-de-rede Michael, da equipe adversária, o Vôlei Futuro, preparava-se para sacar. E isso ocorreu mais de uma vez. Da mesma forma, um acontecimento lamentável. Muito triste.


Como era de se esperar, a repercussão do ato de homofobia ocorrido não foi bem recebido pela mídia e uma mobilização anti-homofóbica invadiu a televisão e culminou no jogo seguinte entre ambas as equipes, no sábado, 9 de abril. O Vôlei Futuro venceu a equipe do Cruzeiro por 3 sets a 2, numa partida bastante equilibrada. Mas a vitória residiu, efetivamente, no ato anti-homofobia pela equipe e torcida do Futuro.


Como relata a reportagem da E-Band, de sábado, mesmo dia do ato, a torcida estendeu uma bandeira com a inscrição “Vôlei Futuro contra o preconceito” e agitou bastões rosa em repúdio à vergonhosa atitude do dia anterior. Os gandulas vestiram camiseta rosa e o líbero Mário Júnior utilizou uma camisa com as cores do arco-íris.


Gostaria de chamar a atenção a esse deplorável acontecimento. Escancaradamente, ele pode ser considerado um fato isolado. Mas velado, é uma realidade quotidiana de todos os ambientes de trabalho. O preconceito que diz respeito à cor, classe social, opção sexual, principalmente estes três aspectos, ocorre dissimulado, vez ou outra vez à tona e a opinião popular condena.


Lembro de quando estava na 5ª série e tentei entrar para a equipe de futebol do colégio. Assim como a maioria de meus colegas, tinha o desejo de ser um sucesso entre as quatro linhas do gramado. E do mesmo modo, junto à maioria dos que tentaram ser aprovados no teste, fui reprovado e tive que tentar outro esporte. Um professor chegou à sala de aula e fez propaganda do voleibol, interessei-me e comecei a treinar. Depois, alguns colegas começaram a falar que era jogo de menina, que “não era coisa de macho”. Senti vergonha no início, mas com o tempo passei a entender que era puro preconceito arraigado no imaginário das crianças. Um esporte não define a sexualidade de ninguém. E essa opção sexual, seja qual for, aprovada ou não, deve ser respeitada.


Da mesma maneira que crianças de 10 anos pensam como meus colegas, quando se tornam adultos, desmascaram-se como pessoas inflexíveis nas suas teorias sobre “como o mundo deve ser” e discriminam colegas de trabalho, funcionários, amigos e desconhecidos.


Quem não tentou ouvir na infância, uma piada imprópria a crianças? As de conotação sexual são contadas longe dos pequenos. Mas se é uma “piadinha inocente” sobre negro, gay e “gordo”, o acesso é livre ao rol de anedotas. Censura zero.


Por mais engraçadas que sejam e ainda que discursemos que “é uma simples piada, porque não sou racista, nem homofóbico”, os relatos engraçados reforçam aos adultos a ideia transmitida na história e sentencia às crianças, ainda que de maneira bem sutil, conceitos discriminatórios. É como um remédio homeopático medicado. Aos poucos, sem que se perceba, o conceito preconceituoso está formado e nem nos tocamos de onde ele surgiu.


Pode ser que tenhamos atitudes discriminatórias e nem percebamos. Mas, em muitos casos, temos a total ciência do que dizemos e devemos arcar pelo palavreado reprovável. Ícone disso é o deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ), que no Programa CQC, da TV Bandeirantes, de 28 de março, respondeu a perguntas e destilou formidáveis frases: “O que você faria se tivesse um filho gay? Isso não passa pela minha cabeça, porque eles tiveram uma boa educação. Sou um pai presente, então não corro esse risco”.


Bolsonaro foi, ao menos, sincero, coisa que muito político não é. Isso que disse é o que realmente pensa. Sendo condenável ou não, retrógrado ou não, é um retrato fiel do seu pensamento. É a única coisa louvável no parlamentar.


Aprender a conviver com as diferenças é uma máxima que comunga o discurso-comum. Querer ver o outro lado, a outra perspectiva, não é tão simples assim. O deputado falou asneira e está sendo processado por isso. A torcida do Sada Cruzeiro e a equipe também estão sendo devidamente sancionados legalmente. E nós? Realmente não pensamos como a torcida mineira ou guardamos em silêncio as mesmas palavras que humilharam o jogador do Vôlei Futuro?

sábado, 9 de abril de 2011

QUESTIONAMENTOS DE REALENGO

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 10 de abril de 2011.


Além do assassino, estou convicto de que outras pessoas sabiam que uma chacina ocorreria na Escola Tasso da Silveira, em Realengo, Rio de Janeiro, na última quinta-feira. Essa linha de raciocínio parece-me mais coerente que crer que Wellington Menezes de Oliveira pensou em tudo sozinho. Se fosse assim, por que ele destruiria o seu computador? Estando morto, não teria por que temer verem suas informações no PC. Queimou o equipamento porque alguém o convenceu a fazer isso. Quem leu sobre o assunto se consterna e quem viu os vídeos da fuga das crianças, arrepia-se.
Wellington era um jovem introspectivo e, aparentemente, guardava para si os ressentimentos. Ele não era muito sociável, não saía com garotas -possivelmente resultado do seu comportamento- e tinha um gosto musical hardcore, mas não havia nada que despertasse a atenção quanto à periculosidade que representava. Mesmo depois do massacre, muitas questões continuam pairando no ar, sem resposta. Como avaliar que ele era um psicopata em potencial? Onde houve falhas na sua educação que o levou a tornar-se o vilão de uma história que choca pelo requinte de crueldade?
Não se pode colocar a culpa em uma pessoa, apenas. Muita gente cruzou pelo rapaz, durante a sua vida, e ninguém constatou nada além de ser esquizofrênico, vítima de bullying e introspectivo. Poucos argumentos para deduzi-lo como um possível assassino. Se havia uma patologia, a esquizofrenia, por que o Estado não o estava tratando? E a família, como enfrentou esse assunto, se enfrentou?
Já o acesso às armas, alguém que deve ter lhe ensinado a atirar, fornecedores de armamento e munição e “amigos” lhe incitando para que se vingasse das garotas e garotos que outrora lhe humilharam, fizeram dele uma pessoa muito perigosa.
Na sua carta de despedida, deixa claro que era virgem: "...os impuros não poderão me tocar sem luvas, somente os castos [...] nem nada que seja impuro poderá tocar em meu sangue, nenhum impuro pode ter contato direto com um virgem sem sua permissão...". Talvez isso tenha relação com o desequilíbrio no número de mortos entre homens e mulheres: 10 meninas e dois meninos. Se tinha problemas com garotas quando era estudante e isso lhe motivou a vingar-se, a desforra ocorreu entre muitas aspas, pois aqueles que lhe humilharam quando criança, hoje são adultos que não estavam no local. E as crianças que ficaram feridas e as que faleceram nunca tiveram relação com os traumas passados.
A violência escolar tem sido ilustrada por alunos batendo em professores, matando-os, e em todos os casos, os motivos são fúteis. Mas chacinas como a de Realengo não haviam ocorrido ainda. A Tasso da Silveira torna-se a primeira escola. Como disse o Juremir Machado em sua crônica no jornal Correio do Povo (jornal de Porto Alegre, RS) de sexta-feira, 8 de abril, entramos para o triste time dos países de chacinas escolares.
Outras nações já foram notícia no mundo sobre atentados em escolas, como a Finlândia e o Canadá. E encabeçando a lista, está os Estados Unidos. Dentre os vários assassinatos ocorridos, os de maior destaque ocorreram em 1999 e 2007. Em 1999, morreram 13 pessoas na escola secundária Columbine, no estado do Colorado. E em 2007, 32 pessoas foram assassinadas na Universidade Virginia Tech, na cidade de Blacksburg, cidade próxima a Washington. Parece uma “onda” norte-americana, onde jovens desequilibrados espelham-se em outros desequilibrados e executam seus planos diabólicos.
Já foram presos dois homens que confessaram terem vendido o armamento ao assassino de Realengo. Aos poucos, a polícia começa a descobrir todos os culpados pelo ocorrido. Porque tão culpado quanto Wellington são aqueles que lhe forneceram armamento, quem o incentivou a cometer os assassinatos e quem ajudou a planejar as execuções.
O país escreve uma mancha vermelha em sua página histórica. Com o amargo gosto de sangue na boca. Ficam os questionamentos: mais segurança nas escolas? Usar detectores de metal, pôr um policial na porta de cada instituição de ensino? E isso tudo resolverá o problema? Os próximos dias serão de muita comoção e de respostas. Respostas sobre Wellington e sobre como anteciparmo-nos a novos episódios lamentáveis como o da escola de Realengo.

segunda-feira, 4 de abril de 2011


minha namorada me disse ontem que esses nossos 3 meses de namoro foram os 3 melhores meses da vida dela.
e da minha também.
tem declaração mais linda que essa?
tem coisa mais maravilhosa que ouvir isso?
nao, definitivamente, nao

te amo bruuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu

domingo, 3 de abril de 2011

Tradutor de porta de fórum

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 03 de abril de 2011.

Participei, em janeiro deste ano, de um fórum de literatura na cidade de Santiago - RS, organizado pela Casa do Poeta de Santiago. Era época de férias, descanso pra todo mundo, um ótimo momento para os adoradores das letras, de poesias, contos, crônicas, declamações e quaisquer assuntos afim, encontrar outras pessoas convictas dessa paixão e trocar experiências. Mas eis que da minha cidade somente estava eu. Convidei todos os colegas que pude, mas o insucesso foi total. Não vai dar, vou estar viajando, gastei muito dinheiro com festa e não vai sobrar pra ir. Está explicado. É gasto com hotel, alimentação lá e três dias gastos (não investidos). Bem melhor ficar em casa tomando a cervejinha, assistindo à tv e dormindo até às 10h.
Fiquei no segundo dia junto com o pessoal da recepção. Fui barrado na entrada por uma ex-colega de faculdade que recepcionava o público. O papo ficou tão bom que acabei deixando para assistir às palestras para o próximo turno. Por se tratar de um fórum onde palestravam brasileiros e argentinos, havia intérpretes que faziam a ponte comunicativa entre os dois idiomas. Lá na recepção, assumi, sem querer, o mesmo papel.
Essa minha colega é excepcional no inglês, mas uma negação no espanhol. Com todo o respeito, é claro. E como eu estava ao seu lado, aproveitei e pus na prática os meus conhecimentos aprendidos na faculdade, da língua hermana. E foi uma ótima experiência que tive naqueles dias. Porque não há nada melhor para exercitar o seu conhecimento numa língua que falando com um nativo.
Não bastasse haver ganho o dia por ter falado com nossos amigos argentinos e ter conseguido expressar-me eficientemente, outro fato veio a valorizar ainda mais a ida solitária ao fórum.
Após sofridos dez minutos de luta contra a tampa do radiador do carro, consegui abri-la na manhã do último dia. Havia uma plateia particular, saboreando meu sufoco. Um senhor de certa idade, pois não era, exatamente, um idoso, porque isso vai mais da mente da pessoa do que o biológico. Era o senhor Joaquim Moncks, meu vizinho de quarto do hotel, que eu havia no dia anterior ajudado a pôr para funcionar seu gravador de áudio. Ele é o Coordenador Executivo da Casa do Poeta Brasileiro (POEBRAS Nacional), a entidade que lidera as várias Casas do Poeta, Brasil afora.
Conquistado o objetivo de abrir a detestável tampa, completei o nível de água que precisava, tampei novamente, fechei o capô do carro e preparei-me para ir ao fórum. Você me dá uma carona? Mas é claro! E o senhor Moncks foi comigo até o evento. No pouco tempo juntos, conversamos sobre produção literária e ao estacionar o carro ele pegou a sua sacolinha e começou a entregar-me alguns livros. São para você. Agradeci e perguntei-lhe quanto custavam, pois eram seis livros. Geralmente os regalos constituem-se de um, no máximo dois exemplares. Não custa nada.
Acho que nessa hora minha boca sorriu de canto a canto do rosto. Não bastasse o interesse daquele senhor, o presente era mais que bem-vindo, devido à qualidade dos textos e da importância de cada um.
Recebi, é claro, uma dedicatória. Foi o segundo presente em pouco mais que dois dias. A charla com os amigos argentinos e os livros do senhor Moncks. Quem sabe se algum colega meu fosse ao fórum, também tivesse essa mesma impressão positiva da atividade literária. Só indo para saber. Eu fui.

domingo, 27 de março de 2011

QUANDO HÁ VONTADE POLÍTICA

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 27 de março de 2011.


Há uma grande diferença entre dizermos “quando vontade” e “quando vontade”. Se vontade, é porque interesses estão em jogo: seja particular, de uma sociedade ou de uma nação. Se vontade, geralmente é resultado de estarmos sendo pressionados para realizar determinada coisa: em política falamos de pressão da opinião pública.
E os nossos governantes trabalham assim. Quando vontade política, pode saber: alguma estão aprontando, é dinheiro ou vantagem que estão pondo no bolso. Quando vontade é porque a mídia e ONGs estão pressionando e a vontade popular clama por mudança.
Difícil não concordar: reclamamos da burocracia que retarda obras, não deixa chegar recursos que seriam muito importantes para pessoas carentes. Mas, quando vontade política, os governos demonstram enorme capacidade de mobilização e agilidade na tramitação de leis. Que o diga Julian Assange, fundador do WikiLeaks. Feriu os interesses dos Estados Unidos e de países europeus e rapidamente foi tirado de cena, sendo preso sob uma acusação que nunca teria que responder se não falasse demais - a verdade.
Um dos problemas que muitos governos enfrentam é o não-planejamento da utilização de recursos. Então, a demora no repasse das verbas e a burocracia fazem jorrar pela torneira afora muito dinheiro que poderia ser bem empregado em áreas necessitadas. Contudo, quando vontade política, não falta planejamento. Cria-se a estratégia -que todos conhecemos e que sempre surte efeito- de esperar a Copa do Mundo ou as Olimpíadas para votar mais um aumento. E aprová-lo, como ocorreu no ano passado.
Reclama-se do salário de muitas categorias historicamente postas em segundo plano no cenário orçamentário: segurança, saúde e educação. Porém, quando vontade política, a Câmara dos Deputados vota em regime de urgência e consegue a aprovação da maioria como em um passe de mágica. Prova disso foi o reajuste ocorrido no ano final do passado que transformou os vencimentos do presidente da República, do vice, dos ministros de Estado, deputados federais e senadores em absurdos 26,7 mil reais.
Quando vontade política, o Governo encontra o déficit zero, merchandising de campanha. Foi assim com a Yeda Crusius, ex-governadora do Rio Grande do Sul. Era candidata à reeleição ao governo gaúcho nas últimas eleições. Somou os depósitos judiciais e encerrou os seus cálculos assim: pagamos todas as contas, com déficit zero. Perdeu a eleição e novo governo que assumiu mudou o termo de “déficit zero” para “rombo nas contas públicas”.
A oposição agride ferozmente a situação quando vontade política, exigindo um salário mais digno aos professores. Mas, ao assumir o Governo, o buraco mostra-se mais embaixo: não dá para realizar o sonho pregado outrora. Em contrapartida, se os professores fazem greve, prejudicam o andamento do ano letivo e a sociedade pressiona, começa a dar vontade política: o governo trata de propor algumas migalhas de reajuste salarial.
É o que está ocorrendo com o Governo Tarso Genro, no Rio Grande do Sul. Propôs um aumento de R$ 38,00 ao magistério, correspondente a 10,91% de aumento. Uma proposta anterior de 8,5% já havia sido recusada pelo CPERGS (Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul). É dessa maneira que o Estado pretende valorizar a classe?
O novo Plano Nacional de Educação (PNE 2011-2020) foi aprovado pelo Governo Federal e reza em sua cartilha que 7% do PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil deverá ser aplicado na educação. Para termos uma ideia de como estamos longe desse objetivo, em 2000, 3,9% do PIB era aplicado em educação e em 2008, o percentual variou para míseros 4,7%. O Governo demonstrou, até o momento, que não vontade política em priorizar o magistério.
Se não vontade política em valorizar a classe dos professores, então que isso ocorra quando vontade política, através da pressão da sociedade. Porque muito mais alto que os 7% almejados para a educação, é o preço que pagamos pelo sucateamento de escolas e pela desvalorização dos professores.

domingo, 20 de março de 2011

A escola é igual ao BBB?

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 20 de março de 2011.

Escola é igual a BBB. Tem o líder -professor- que nos manda para o paredão -provas-, mas somos salvos pelo anjo -nerd. É o título de uma comunidade do Orkut, uma associação feita muito inteligente. Só dessa comunidade, são mais de 190 mil membros. Não é a opinião de todos, mas vemos o retrato do pensamento de grande parcela da população que sente na escola, uma chata obrigação diária.
Temos heróis no BBB, como reza a metáfora do Bial. Heróis que são projetados para a fama momentânea sem esforço algum. Já os heróis da vida aqui fora, recebem o título por conseguirem cursar as 11 séries da educação básica. Estamos a caminho dos 12 anos de luta heroica. Felizes e heróis, sim, são aqueles que tiveram a oportunidade de estudar e não precisaram abandonar os estudos para trabalhar ou porque engravidaram.
Corrigindo a equivocada hipérbole do Pedro Bial, heróis são os jovens integrantes do BBB escolar que trabalham à noite e estudam de dia, ou vice-versa. Heróis são as mães de primeira viagem que conseguem deixar seu primogênito com a vó por um turno e não desistem de estudar. Heróis são aqueles que foram pouquíssimo estimulados na infância e quando o número de professores e de matérias aumentou, não desistiram e enfrentaram com bravura as suas dificuldades de aprendizagem. Gladiadores são os jovens que lutam contra alguma doença e, mesmo assim, persistem frequentando os bancos escolares. Heróis são os jovens que repetem o ano e assim como a fênix, renascem das cinzas e são aprovados no ano seguinte.
Trabalhar e não conseguir conciliar com os estudos, a gravidez, a falta de interesse do aluno ou enfrentar um problema familiar são as três maiores razões que levam o estudante mineiro a abandonar a escola. A pesquisa “Determinantes do abandono do Ensino Médio pelos jovens do estado de Minas Gerais”, promovida pelo Instituto Unibanco e que vem como encarte da edição de março da Revista Nova Escola, faz um levantamento dos motivos da evasão escolar e propõe mudanças.
A pesquisa diz respeito ao estado mineiro, mas pode ser estendida a todo o país. Apesar das peculiaridades de cada estado, da renda per capita ser diferente nas diversas regiões brasileiras, o ensino público e privado também, podemos utilizá-la como referencial.
Vamos dissecar os dados atinentes às razões do abandono dos estudos. 56,6% apontou a impossibilidade de conciliar a escola com o trabalho; 11,6% disse que não tinha interesse em estudar; a gravidez foi apontada como motivo por 6,5% dos jovens; e 3,3% enfrentaram problemas familiares que impossibilitaram a frequência na escola.
Dentre os problemas, ressalto os dois mais significativos. O drama da relação trabalho X estudo, que é uma realidade em nosso país, e a falta de interesse dos jovens. Temos milhões de miseráveis, sem esperança alguma de mudança. Milhões vivendo na pobreza absoluta. Muita gente precisando fazer bico até altas horas para conseguir alimentar-se. Desse modo, onde fabricar tempo para estudar?
Já quando falamos na falta de interesse do aluno, podemos perguntarmo-nos: o que o docente e a instituição estão fazendo para que o aluno perceba a importância de estudar? Com o cinto mais que apertado em casa, a escola torna-se um rito de passagem que não demonstra boas perspectivas.
Vou acabar o ensino médio e depois, o que vem? O que todos esses anos de estudo valerão para mim? A Escola, no sentido amplo da palavra, necessita disponibilizar mais cursos técnicos que insiram o jovem no mercado de trabalho. O ENEM firmou-se como grande ferramenta de ingresso nas instituições de ensino superior. Mas tem muito jovem sem saber disso. O professor não está fazendo o seu papel bem, de orientar. Nem a família, porque deveria preocupar-se prioritariamente com o futuro de seus descendentes. Nem o jovem, que negligencia o próprio futuro.
No Big Brother Brasil, os pseudo-heróis enfrentam o drama de não ganhar o milhão de reais que nunca tiveram. Já os heróis do BBB do Mundo Real, enfrentam o drama de perderem uma passagem para um futuro melhor. A seleção dos candidatos do BBB do Mundo Real é gratuita, basta matricular-se no ensino regular ou na Educação de Jovens e Adultos. Mas ganhar o prêmio final é muito mais difícil, por vezes impossível, para uma enorme parcela da população.

segunda-feira, 14 de março de 2011

A AUTOAJUDA NOSSA DE CADA DIA

Publicado no Jornal da Cidade Online, de 13 de março de 2011.

Estive, há alguns dias, no lançamento do livro de crônicas “Umas e outras” do psiquiatra Rônei Rocha, daqui da minha cidade. Houve grande quantidade de pessoas prestigiando o evento, esperando na fila uma dedicatória do médico-escritor. Assim como ele, outro médico gaúcho teve o seu trabalho reconhecido: Moacyr Scliar. Infelizmente, este último faleceu em 26 de fevereiro passado. Como conseguiram tamanha projeção?
O psiquiatra que conheço começou a escrever num jornal local há menos de um ano. Ascendeu vertiginosamente. A chave do sucesso? A importância que damos aos assuntos que abordam o nosso interior, o íntimo. Daqueles assuntos que temos medo de falar e que alguém vai lá e escreve, livrando-nos do peso da culpa de não termos nos expressado.
Essa relevância da busca de um eu mais clean, livre e feliz reflete-se na busca pelos livros de autoajuda. Eles costumam ser os recordistas de vendas em feiras de livro. Têm lugar cativo em livrarias. Sites como Americanas, Submarino e da editora Saraiva e tantos outros deixam bem visível o título “autoajuda” para que os internautas encontrem sem dificuldade os seus tão desejosos gurus impressos.
Disse um amigo meu, já no final da festividade, um tanto emocionado e alcoolizado: “Aqui tá cheio, mas se viessem todos os clientes dele, isso aqui estaria entupido de gente. Só tem louco nessa cidade”. Preconceitos à parte, desconsideremos o termo “louco”. Problemas de ordem emocional, psíquica e que não conseguimos resolver sozinhos ocorrem aos montes. Vez ou outra cai bem consultar, pedir uma ajudinha de terceiros. Como o próprio Rônei disse em uma de suas crônicas, nos manicômios estão apenas alguns loucos, o grosso da tropa permanece nas ruas.
Muitos livros de autoajuda estampam fórmulas mágicas para resolvermos os nossos “poréns”. Alguns se valem da psicologia para falar o óbvio, e esse óbvio é o que geralmente necessitamos ouvir - ou ler. Através de metáforas simples, criando enredos fantásticos, por vezes, ou sendo diretos, os autores atingem-nos e fazem pensar, refletir. Essa pausa que fazemos para ler, aliado a palavras de conforto ou motivação, elevam a autoestima e despertam as vontades que hibernavam lá no fundo, no âmago de cada um.
Anos atrás, li os primeiros capítulos do livro “Seja feliz sem querer controlar tudo”, do Joe Caruso. O livro falava o que estava na cara: mesmo que tentemos controlar tudo a nossa volta, não conseguimos e nem conseguiremos. Se achamos que dominamos a situação, estamos redondamente enganados. Podemos controlar a nossa reação diante dos fatos, mas pouco podemos interferir nos fatos. Não adianta ficar remoendo capítulos desgostosos da nossa vida, nem reclamar de um fato já ocorrido.
Nada do que li era espetacularmente novo, mas era apresentado sob uma ótica diferente da que eu estava acostumado a observar. Que não adianta “chorar o leite derramado” eu já escuto desde criança. Mas inserir, efetivamente, este ditado e tantos outros na prática, na vida, são outros 500.
Da mesma forma que eu necessitava aquela vez ler o óbvio e descobrir algo novo no velho, tantas outras pessoas precisam ler “Quem mexeu no meu queijo”, “O monge e o executivo” e “Os segredos da mente milionária” para descobrir o elixir satisfação eterna. Quando o assunto fica mais grave, a opção é recorrer a psicólogos e psiquiatras. Só com a ajuda de pessoal especializado conseguiremos “descascar alguns abacaxis maiores”.
Com temática semelhante à do cronista uruguaianense, Moacyr Scliar escrevia para o Grupo RBS, afiliado à Globo, e tinha, dentre os seus espaços na mídia, uma coluna semanal no Jornal Zero Hora. Fizera medicina na UFRGS em 1962 -Universidade Federal do Rio Grande do Sul- e faleceu com 73 anos. Sempre abordava algum fato do cotidiano, tendo a medicina como fator de relação entre os assuntos.
Procuramos sempre palavras que nos confortem. Por vezes, um caderninho com frases para iniciar o dia lendo, refletindo e se motivando. Em outras, um livro devorado em horas, servindo como bálsamo. Mas nada melhor do que trocar meia dúzia de palavras com um amigo. E se nada disso resolver, resta procurar um especialista no assunto, que terá mais meios para orientar o caminho a ser percorrido.
Os livros são muito importantes na nossa formação permanente. Mas são apenas uma representação gráfica daquilo que pode ser dito com mais recursos -timbre de voz, emoção, gesticulação e entonação. Porque não crescemos sozinhos. Precisamos do outro para conversar, refletir, pensar, se emocionar, amar e ser amado.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Tá com pressa? Sai mais cedo

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 08 de março de 2011.

Um motorista para atrás de uma manifestação de ciclistas, acelera com o seu carro, atropela muitas pessoas e foge do local. Depois, diz à televisão que estava sendo ameaçado pelos ciclistas e que se sentia acuado, não tendo outra alternativa que não avançar contra a multidão. Justificando a sua fuga, argumentou que se ficasse no local, seria linchado. O fato ocorreu em Porto Alegre, no dia 25 de fevereiro, o carro era um Golf e o motorista que tentou assassinar os ciclistas chama-se Ricado José Neis.
A sua arrogância em tentar inverter as culpas e fazer dos ciclistas os vilões da história faz pensar que as pessoas, ainda, acreditam que desculpas de pré-escolares podem ser aceitas sem revolta. Não tem como engolir. A mentira é descabida e os vídeos gravados em celulares ilustram todo o desespero em que o Sr. Neis transformou aquele protesto.
Não é de hoje que é perigoso trafegar em vias próximas a Ricardo Neis. Ele já havia cometido outras infrações graves de trânsito. De acordo com o Jornal da Band de 1º de março, o Sr. Neis já fora flagrado andando na contramão e dirigindo com excesso de velocidade.
A Disney antecipou a história do Sr. Neis, chamando-o de Sr. Willer. No enredo, o motorista era um pacato cidadão chamado Sr. Walker que se transformava no temível motorista-assassino, Sr. Willer.
Desculpas desprovidas de qualquer coerência como a do Sr. Neis são encontradas de forma barata em nossa sociedade. Deputados e senadores argumentando que não recebem reajuste há anos e transformarem seus vencimentos em gordos 26 mil é tão surreal quanto as desculpas do motorista gaúcho.
A impunidade que esperamos não bater à porta de Ricardo Neis assombra-nos, atemoriza, pois é comum num país empanturrado de leis que não são cumpridas. Não vamos muito longe. No último novembro, no mesmo bairro de Porto Alegre, o Cidade-Baixa, uma juíza aposentada “furou” uma blitz e acidentou-se com outros sete veículos. E a pergunta que não quer calar: Vossa Excelência foi presa? De modo algum. Deu uma passeada na delegacia de polícia, recebeu sua CNH de volta sob a condição de comportar-se (lindo conselho!) e foi embora dormir, sossegada. Deveria ter sido presa, mas se negou a fazer o teste do bafômetro, e, mesmo andando cambaleante, o laudo médico da perícia conseguiu ser inconclusivo.
Não nos assustemos com o Sr. Neis. Muitos outros motoristas perigosos estão à solta nas ruas. Alguns já foram presos, outros multados, outros subornaram e alguns ainda não foram flagrados. Não é de hoje que ouvimos histórias de amigos que relatam que tiveram uma discussão “feia” no trânsito, ou que sabe de uma briga por vaga em estacionamento, ultrapassagem perigosa ou um bate-boca no semáforo.
Estamos inseridos numa cultura consumista, reprodutora dos prazeres e desejos norte-americanos. Lá no Hemisfério Norte, a palavra de ordem é comprar. Os carros necessitam ser grandes e potentes. Precisam ter um forte ronco do motor. Moto não é moto se for de baixa cilindrada. Velozes e Furiosos (The Fast and the Furious) é sucesso lá e aqui. E é feio o motorista que dirige usando o cinto. Ou o motorista que não rebaixa o carro, não põe uma roda esportiva e que anda devagar.
Ao Sr. Ricado Neis, que parecia tão apressado no boliche humano e insensível por não parar, mesmo depois do atropelamento em massa, relembro uma frase de parachoque de caminhão que gosto muito: tá com pressa? Sai mais cedo!

sábado, 19 de fevereiro de 2011

DO TEMPO DO MIMEÓGRAFO

Você lembra daquela maquininha que de uma matriz com papel carbono faz surgir muitas cópias a medida que uma manivela é girada? Pois encontrei um exemplar desses, o mimeógrafo, no Museu das Comunicações de uma universidade que visitei. Estavam expostos diversos objetos utilizados no Século XX. Eram rádios gigantescos e nos mais diferentes formatos, televisores de imagem preto e branco, discos LP, os primeiros aparelhos de fax e de telefone que surgiram no mercado, máquinas de escrever e o dito mimeógrafo.
Ele é um artefato do passado, mas, infelizmente, também do presente. Não deveria mais ter lugar nas salas de aula, contudo, continua sobrevivendo como ferramenta em muitas escolas brasileiras. Tão triste quanto isto é constatar, também, que além de não nos desprendermos de objetos do passado, ignoramos as novas tecnologias. O computador, projetores de imagem, aparelhos de DVD e de som são mídias mais atualizadas, mas continuam sendo monstros para grande parte dos docentes. Assim como é retrógrado o uso do quadro-negro para transmitir toda a matéria à turma.
Não apenas em turmas de ensino fundamental e médio deparamo-nos com quadros cheios de conteúdo rabiscado. Não raro o mesmo ocorre nas salas de aula de ensino superior, seja nos cursos de formação de professores ou em outros. E esses mesmos professores ainda querem que seus alunos sejam dinâmicos em sala de aula, que utilizem toda a tecnologia disponível para facilitar a aprendizagem dos discentes. É muita hipocrisia. Ou falta de sensibilidade para não perceber a incoerência do discurso com a prática.
A lousa deve ser utilizada como um meio auxiliar, onde o docente aponta alguma observação que vá surgindo durante a aula. Se existem folhas e a máquina copiadora já foi inventada, por que não usar? Desse modo, ao invés de perder tempo transcrevendo as regras gramaticais para o caderno, o aluno poderá ler com a turma a matéria, realizar exercícios, fixar o conteúdo e unir o que assimilou com todo o conteúdo da disciplina.
A mera cópia para o caderno dos vocábulos escritos na lousa não ensina nada. Aí, abre-se margem para que surjam piadinhas nem tão distorcidas da realidade como a que diz que o professor faz de conta que ensina e o aluno faz de conta que aprende.
Que atrativos terá uma aula com apenas caderno, caneta e um professor sentado falando, se o aluno chega em casa ou vai numa cyber, acessa o Orkut, conversa com outras pessoas pela rede, atende ao telefone, fotografa algo que acha interessante, filma alguém, envia um torpedo e escuta uma música do mp3 pelo fone de ouvido? Há muito mais dinâmica nas interações extra-escolares que dentro da sala de aula. Se o que ele faz na escola tiver relação com o que vive fora dela, a aula será atrativa.
Lógico, a teoria anda muito bem quando dissociada da prática. Pois pôr todo esse palavreado dentro da aula é uma tarefa árdua e que exige grande esforço do professor. Ele necessita estar atualizado com a evolução digital, com os fatos cotidianos e não pode esquecer de entrelaçar a essas mídias, as matérias inerentes à série.
Conforme reportagem da revista Nova Escola de janeiro/fevereiro de 2011, existem 67,5 milhões de pessoas com acesso à internet, incluído o uso em lan house e no trabalho. São 34,9% dos brasileiros. Temos computadores desktop (de mesa), notebooks, netbooks e tablets a nossa disposição. É uma infinidade de aparelhos que nos conectam à internet e com inúmeras funções. É uma realidade que não podemos ignorar. Mais que isso, devemos incluir no estudo. Utilizar a nosso favor as redes sociais como Orkut, Facebook, Badoo e os blogs e sites especializados em disciplinas curriculares.
Os computadores estão cada vez mais baratos e acessíveis. Urgem como necessários em sala de aula na construção do conhecimento do aluno. Aulas iguais às que nossos pais tiveram na infância e adolescência não são mais bem-vindas. Porque não há nada de atraente nelas. Enquanto o professor ficar escrevendo textos e textos no quadro ensandecidamente, seus alunos estarão ouvindo mp3, trocando torpedos ou tirando fotos com seus celulares. E aí, sim, faremos valer a triste máxima de que o professor faz de conta que ensina e os alunos fazem de conta que aprendem.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

A garota do assento sanitário

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 13 de fevereiro de 2011.
Perguntei-me, há alguns dias, o que levaria uma empresa que vende assentos sanitários a colocar a imagem de uma mulher na embalagem do produto. Não fui só eu. Quem estava a minha volta questionava-se, também, quanto ao motivo. Estranhamente, aparecia escrito “assento sanitário plus – modelo universal”. Havia mais informações, inclusive: “material almofadado. Acesse nosso site www.nomedaempresa.ind.br". Tinha, também, o SAC, Serviço de Atendimento ao Cliente. Fiquei tentado a ligar para lá e indagar o motivo de uma mulher jovem, possivelmente antes dos 20 anos, loira, produzida um pouco no Photoshop (arrisco eu), aparecer na embalagem de algo que serve para as pessoas sentarem na hora de irem aos pés.

As cervejarias e outras que vendem produtos de baixo valor e grande vendagem utilizam uma técnica semelhante, onde associam os seus produtos a imagens de mulheres impecavelmente lindas de rosto e corpo, banhadas em pó, luzes e retoques digitais para deixar perfeitas todas as silhuetas dos seus corpos. E para que tudo isso? Pesquisas comprovam que no momento que um homem (o maior cliente quando se trata de cerveja, neste exemplo) vê a imagem de mulheres bonitas na televisão, tende a ser mais impulsivo. E como uma cerveja é relativamente barata e dá para comprar na esquina, esse impulso leva-o a comprar pelo menos um exemplar de cevada. Depois de fazer esta associação, constatei que os donos da empresa de assento sanitário devem ter pensado na pesquisa e tentado adequá-la ao produto que vendiam.

Ainda ilustrando essa situação, a Antarctica lançou a Juliana Paes tomando cerveja, o que inicialmente não tem nada a ver uma coisa com a outra. Mas criaram toda uma história para que houvesse relação. Dessa maneira, toda hora que a Juliana for vista, a mente vai remeter à cerveja e à vontade de beber.

Há pessoas que são assim. Você vê um eu que não é o verdadeiro. É apenas aquela imagem bonitinha, certinha e perfeita que é transmitida com o intuito de parecer ser alguém seguro de si, alguém que resolve todos os problemas num passe de mágica. Um super-herói. Mas descobrimos ainda na infância que superpoderes só existem na ficção. No entanto, continuamos acreditando que existem super-heróis na quadra ao lado. E tentamos, inutilmente, ser como aquele nosso farol, nosso deus particular. Fracassamos e jogamos a culpa em nós, que somos incompetentes. Ledo engano. A pessoa segura que vemos treme de medo ao sair de nossa visada. A pessoa a qual aspiramos ser chora deitada na cama. A pessoa que endeusamos clama por ser criança de vez em quando, ao aparecer um problema de difícil solução. Assim como nós, os reles mortais.

Mas, também, há outro motivo para ver uma garotinha bonita na tampa de um assento sanitário. Qual é a primeira coisa que uma mulher se preocupa quando entra numa casa? Se ela é higiênica. Em especial, se o banheiro é limpo. E nada mais íntimo que a tampa do vaso, o assento sanitário. Por isso a preocupação da empresa em associar a imagem de uma garota à “tampa injetada em polipropileno de alto brilho com base soprada com PEBD/EVA preenchida com espuma de poliuretano”. Ao olhar para a imagem da menina na capa do assento, a mulher tem a sensação de que a garota já o usou e o aprova. Isso quer dizer que é um produto higiênico, limpo, de qualidade, que pode ser comprado.

A aparência sempre foi protagonista. O conteúdo continua remando para assumir a relevância devida. Ser apenas um rostinho bonito pode abrir algumas portas, mas não dá a chave da casa. Para isto, o conteúdo se faz necessário. Não compensa ser o que não somos, porque um dia a máscara cai e o verdadeiro rosto, feinho, se descortina.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

VOCÊ FALA CORRETAMENTE?

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 06 Fev 2011
Essa língua portuguesa vem, cada vez mais, conspurcada... Deletou o texto? Printou o texto? A língua sendo engolida por essas coisas todas... pode ser um processo normal, pode ser um enriquecimento da língua, mas pode ser, também, às vezes, um desvio.
Pode ser um abuso, porque se você tem a palavra em português, por que não usá-la corretamente? Essa invasão da língua talvez seja não conhecer a língua e vai assimilando o que vem como vem.
Aí vem com a bandeira de libertário, de inovador. É um grande engano.
Por favor, não atirem pedras neste cronista. Apenas reproduzi a fala tosca do jornalista e escritor Ignácio de Loyola Brandão, em entrevista ao professor Pasquale Cipro Neto, num DVD da TVEscola, promovido pela Secretaria de Educação a Distância do Ministério da Educação. Na ocasião, o escritor comentava do grau de responsabilidade que possuía um cronista de jornal. Ele via o seu papel de comunicador como uma grande ferramenta na ajuda a lutar por uma língua mais pura, ou menos conspurcada, ou seja, menos suja, corrompida. Vernáculo este que poucas pessoas utilizam. Geralmente são do rol discursivo de teóricos, intelectuais, nas suas ânsias em demonstrar toda a gama de conhecimento que possuem. Não passa de erudição quadrada, arcaica, retrógrada, infeliz.
Pois esse purismo de Ignácio de Loyola está em todo canto, mascarado em forma de piadinha entre amigos, discriminação de alunos com outros. Os estudantes de escola rural que saem do seu lócus e buscam vida melhor na cidade encontram uma realidade cruel. São discriminados pela sua fala caipira, diferente da fala da elite. Das pessoas que acham que conseguem flexionar verbos e estruturar orações como se habitassem o mundo do Parnasianismo de Vaso Grego e Vaso Chinês, preocupados tão só com a estrutura, de discursos esvaziados.
Joga nesse time torto de puritanos, também, o integrante do programa CQC, Rafinha Bastos. Ele e Marcelo Mansfield analisaram, inoportunamente, a fala do casal Nardoni, numa entrevista do casal para o programa Fantástico, da Rede Globo. Sem a mínima sensibilidade com o tema e desprovidos de conhecimento da gramática, fizeram pouco caso da morte da menina Isabella e tentaram seguir a fórmula mágica do Ignácio de Loyola: falar corretamente e explicar como se faz isso. Mas o resultado foi trágico: demonstraram sua ignorância linguística, que não são pessoas sérias e que a fala coloquial sempre prevalece no discurso. Mesmo quando se tenta ostentar maior sapiência e termos arcaicos são buscados no dicionário apenas com essa finalidade, sempre escorregamos e não falamos o português formal (e irreal).
Em determinado momento, Rafinha critica a coerência da fala do casal e Marcelo complementa “verbo, objeto direto, sujeito oculto, não dá pra entender... ditongo crescente”. Tem frase mais mal estruturada que essa? Citar classes gramaticais, termos da oração, apenas, escancara o ridículo de suas falas. São críticas vazias, inconsistentes. Assim como os Nardoni, utilizaram uma variação não-padrão da língua.
Posicionamentos retrógrados como esses, de um escritor aclamado e de dois comunicadores de grande projeção no cenário nacional, remontam quase à Idade Média. Esse purismo que evidenciam surgiu na França, no longínquo Século XVII. A terra do perfume vivia um regime absolutista, centralizado na figura do rei, detentor de poderes inquestionáveis.
Nasceu com aquela aura e naquele solo, em 1585, Claude Favre, Barão de Pérouges, senhor de Vaugelas. Acreditava, à semelhança de nossos antagonistas, que a “boa linguagem” era a falada pelos aristocratas. A sua visão delimitava-se à condição de que, para falar francês corretamente, deveria-se ter como inspiração a parte mais sadia da Corte. Palavras de Marcos Bagno, professor sociolinguista, estudioso da nossa língua falada, no seu site: “Então, não basta ser nobre, não basta ser aristocrata, é preciso ser mais nobre que a nobreza, mais aristocrata que a aristocracia… O espírito de Vaugelas se incorpora hoje em muitos paspalhos e sacanas que andam por aí atacando as “impurezas” do português brasileiro”.
Paspalhos” como Rafinha e Marcelo Mansfield não deveriam palpitar em campos desconhecidos, deixando claro um posicionamento preconceituoso e inaceitável. Loyola deveria conhecer o profº Bagno. Ou, pelo menos, aprender que os abusos e desvios da língua aos quais ele se referiu, nada mais são que a evolução dinâmica da língua. De todas as línguas, não só a portuguesa. Assim como evoluímos e adaptamo-nos de acordo com o tempo, o que falamos também assume formas diferentes.

Vá mais fundo no assunto.
Assista ao vídeo

Leia sobre o profº Marcos Bagno em http://marcosbagno.com.br/site/?page_id=420

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