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domingo, 15 de maio de 2011

Troque um Bolsonaro por 354 professores

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 15 de maio de 2011.
Quando decidi fazer o curso de Letras, definitivamente, não tive a aspiração de ser rico. Quiçá de viver bem, com um bom padrão de vida, pois o início da carreira de professor com graduação é um tanto doloroso. Os pouco mais de 500 reais mensais pelas 20 horas semanais de aula propostos pelos editais de muitos concursos a professor da rede municipal no Rio Grande do Sul não pagam a mensalidade de outrora da faculdade.

Onde está o retorno financeiro? Aparece apenas aos poucos que logram um curso de mestrado e ingressam na docência universitária. E olha que, ainda assim, não dá para esbanjar. A grande massa fica apenas com a graduação. Não por escolha, mas por que o bolso é pequeno e não há viabilidade para pagar um curso de maior duração e que, fatalmente, demande mais investimentos financeiros.

O que fazemos com os benditos mil reais para oito horas diárias de trabalho? Antes mesmo do aperfeiçoamento profissional, algumas contas brigam entre si para serem pagas. É aluguel, água, luz, condomínio, IPTU, telefone, rancho, os gastos com passagem (porque o meio de transporte é o ônibus, lógico), e outras despesas inevitáveis para a sobrevivência. Que professor terá condições de investir todo o pouco que resta do capital numa assinatura de revista que desequilibra o orçamento? Não esqueçamos que livros didáticos também não são nem um pouco baratos...

A assinatura anual da revista Nova Escola atinge a cifra de R$ 37,00. Uma revista, definitivamente, feita para os professores. Barata. Porque a National Geographic Brasil custa anualmente R$ 179,88. Aventuras na História, R$ 131,40.

E para assinar uma revista semanária como a Veja, os padrões do professorado indicam, visivelmente, que a solução é fazer um “racha” com os demais colegas da escola e deixar a revista exposta na sala dos professores. Leitura apenas nos intervalos ou após o término das aulas. Quem se interessar por algum assunto, tira uma fotocópia e lê com calma em casa. O valor anual da assinatura? R$ 462,78. Comprando a revista avulsa, o custo anual sobe para R$ 694,20. É um aumento percentual que seria muito bem-vindo no contracheque.

Isso me faz ter mais fé na teoria de que o professor foi moldado por Deus e trazido pela cegonha para viver em comunidade. Porque ele é alguém que não consegue viver sozinho. Necessita estar rodeado de alunos perguntando-lhe, sanando dúvidas, pedindo para ir ao banheiro, implorando para adiar a prova, querendo que a aula seja mais light. Esse ser, indubitavelmente, foi fabricado para viver em grupo. O professor necessita viver com outros, muitos outros seres semelhantes, porque senão, vai à falência.

É mentira que querem uma educação melhor. Gente culta não veste involuntariamente a camiseta de massa de manobra. Gente que consegue subir um pouco mais nos degraus escolares não aceita suborno de candidato a deputado ou vereador por necessidade orgânica de alimentar-se. Aceita por opção, pura falta de caráter.

Em contrapartida, deve-se fazer uma mea culpa: há graves erros na administração de escolas, no repasses de verbas, nos currículos escolares obsoletos, ultrapassados. E há formações familiares precárias que refletem em alunos de difícil relacionamento.

O Juremir Machado escreveu a crônica “Complicada complexidade”, dia 18 de abril, no jornal Correio do Povo, falando que problemas complexos não se resolvem com soluções simples, e sim, com soluções complexas. Seria leviano, realmente, dizer que melhorando o salário do professor o problema educacional estaria resolvido. Quem dera... O reajuste salarial não é a única solução, mas é por ele que as respostas devem passar.

Fica claro que o descaso do Estado com o ensino é motivado pela falta de resultados imediatos. Eles aparecem significativamente depois de anos. A verba que vai para escolas e professores não retorna num primeiro momento, no mesmo mandato. As mudanças são graduais, lentas e dependem do sucesso de todos os fatores.

Estou cada vez mais convicto de que a campanha “troque um deputado por 354 professores” é uma das máximas contemporâneas de maior relevância. Esse cálculo realizado e que circula pela internet contabiliza o salário “mixuruca” dos parlamentares, somado aos vale-passagem aérea, vale-assessor, vale-telefone, vale-tudo que o cargo proporciona, e dá conta dos vencimentos de 354 professores.

Li essa frase há certo tempo, numa corrente recebida por e-mail. Ela também apareceu, numa versão mais atualizada, entre estudantes das Etecs (Escolas Técnicas) e Fatecs (Faculdades de Tecnologia) de São Paulo, que protestaram por reajuste salarial nessa sexta-feira, 13 de maio. Sabiamente, dizia “troque um Bolsonaro por 354 professores”. Uma troca onde o custo-benefício compensa.

sábado, 9 de abril de 2011

QUESTIONAMENTOS DE REALENGO

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 10 de abril de 2011.


Além do assassino, estou convicto de que outras pessoas sabiam que uma chacina ocorreria na Escola Tasso da Silveira, em Realengo, Rio de Janeiro, na última quinta-feira. Essa linha de raciocínio parece-me mais coerente que crer que Wellington Menezes de Oliveira pensou em tudo sozinho. Se fosse assim, por que ele destruiria o seu computador? Estando morto, não teria por que temer verem suas informações no PC. Queimou o equipamento porque alguém o convenceu a fazer isso. Quem leu sobre o assunto se consterna e quem viu os vídeos da fuga das crianças, arrepia-se.
Wellington era um jovem introspectivo e, aparentemente, guardava para si os ressentimentos. Ele não era muito sociável, não saía com garotas -possivelmente resultado do seu comportamento- e tinha um gosto musical hardcore, mas não havia nada que despertasse a atenção quanto à periculosidade que representava. Mesmo depois do massacre, muitas questões continuam pairando no ar, sem resposta. Como avaliar que ele era um psicopata em potencial? Onde houve falhas na sua educação que o levou a tornar-se o vilão de uma história que choca pelo requinte de crueldade?
Não se pode colocar a culpa em uma pessoa, apenas. Muita gente cruzou pelo rapaz, durante a sua vida, e ninguém constatou nada além de ser esquizofrênico, vítima de bullying e introspectivo. Poucos argumentos para deduzi-lo como um possível assassino. Se havia uma patologia, a esquizofrenia, por que o Estado não o estava tratando? E a família, como enfrentou esse assunto, se enfrentou?
Já o acesso às armas, alguém que deve ter lhe ensinado a atirar, fornecedores de armamento e munição e “amigos” lhe incitando para que se vingasse das garotas e garotos que outrora lhe humilharam, fizeram dele uma pessoa muito perigosa.
Na sua carta de despedida, deixa claro que era virgem: "...os impuros não poderão me tocar sem luvas, somente os castos [...] nem nada que seja impuro poderá tocar em meu sangue, nenhum impuro pode ter contato direto com um virgem sem sua permissão...". Talvez isso tenha relação com o desequilíbrio no número de mortos entre homens e mulheres: 10 meninas e dois meninos. Se tinha problemas com garotas quando era estudante e isso lhe motivou a vingar-se, a desforra ocorreu entre muitas aspas, pois aqueles que lhe humilharam quando criança, hoje são adultos que não estavam no local. E as crianças que ficaram feridas e as que faleceram nunca tiveram relação com os traumas passados.
A violência escolar tem sido ilustrada por alunos batendo em professores, matando-os, e em todos os casos, os motivos são fúteis. Mas chacinas como a de Realengo não haviam ocorrido ainda. A Tasso da Silveira torna-se a primeira escola. Como disse o Juremir Machado em sua crônica no jornal Correio do Povo (jornal de Porto Alegre, RS) de sexta-feira, 8 de abril, entramos para o triste time dos países de chacinas escolares.
Outras nações já foram notícia no mundo sobre atentados em escolas, como a Finlândia e o Canadá. E encabeçando a lista, está os Estados Unidos. Dentre os vários assassinatos ocorridos, os de maior destaque ocorreram em 1999 e 2007. Em 1999, morreram 13 pessoas na escola secundária Columbine, no estado do Colorado. E em 2007, 32 pessoas foram assassinadas na Universidade Virginia Tech, na cidade de Blacksburg, cidade próxima a Washington. Parece uma “onda” norte-americana, onde jovens desequilibrados espelham-se em outros desequilibrados e executam seus planos diabólicos.
Já foram presos dois homens que confessaram terem vendido o armamento ao assassino de Realengo. Aos poucos, a polícia começa a descobrir todos os culpados pelo ocorrido. Porque tão culpado quanto Wellington são aqueles que lhe forneceram armamento, quem o incentivou a cometer os assassinatos e quem ajudou a planejar as execuções.
O país escreve uma mancha vermelha em sua página histórica. Com o amargo gosto de sangue na boca. Ficam os questionamentos: mais segurança nas escolas? Usar detectores de metal, pôr um policial na porta de cada instituição de ensino? E isso tudo resolverá o problema? Os próximos dias serão de muita comoção e de respostas. Respostas sobre Wellington e sobre como anteciparmo-nos a novos episódios lamentáveis como o da escola de Realengo.

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