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domingo, 24 de abril de 2011

ANNA JULIA, LOS HERMANOS

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 24 de abril de 2011.


ESTAVA LEVANDO MINHA IRMÃ NUMA AMIGA e eis que ocorre uma situação interessante. O rádio do carro tocou uma música que se costuma dizer, foi “desenterrada” da memória, cavoucada até os grotões da lembrança e lançada ao ar. Gente, quanto tempo faz que estourou nas rádios esta música? Mano, muito tempo, credo! Anna Julia, música emblemática dos Los Hermanos, de 1999, idos doze anos atrás. Mesmo sem ouvi-la há alguns, em uníssono, acompanhamos a letra, admirados por ainda recordarmos quase perfeitamente toda a composição.


Um misto de sensações passou na minha mente. Vieram à tona lembranças boas e ruins. Daquele eu de dez anos atrás. Com minhas apreensões de dez anos atrás. A mentalidade da época. Os problemas que eu tinha e que hoje até esquecera que um dia convivera com eles.


Quando uma música nos marca, anos depois ela traz-nos uma doce melancolia que gera risos e choros. Lembramo-nos mais jovens e dos fatos contemporâneos à música que mexeram com nossas emoções.


Quantos relacionamentos foram lamentados sob o fundo de Anna Julia? Uma trilha sonora de corações partidos e mesmo de jovens imberbes à procura do primeiro amor, que buscavam nessa e em tantas outras canções juvenis um bálsamo para a sua solteirice.


Sim, havia pessoas que não gostavam de Anna Julia. Conheci poucas, muito poucas, mas existiam bem mais. Há ainda, aquelas que inicialmente não gostavam do single, mas com o tempo simpatizaram. Isso devido à excessiva exposição da música na rádio e televisão.


Quando ouvimos constantemente uma música, em distintos momentos, mesmo que não gostemos, passamos a associá-la às sensações que sentimos enquanto é executada. Dessa forma, aquela sonoridade que era indigesta transforma-se numa amigável música. Isso deve ter ocorrido com um antipatizante dos Los Hermanos que a ouviu no mesmo momento que recebeu a notícia que seria pai e em homenagem, sua filha recebeu o nome de Anna Julia.


A música tem esse poder. Essa magnífica força de mover-nos para mais à frente, motivando-nos e, com a mesma intensidade, reforçar o sentimento depressivo que possamos estar sentindo. Ela embala todas as idades. O bebê no seu sono inocente. A adolescente no namorisco com o amigo. O adulto, o idoso. Da mesma maneira que Anna Julia embalou-me anos atrás e novas músicas embalam, hoje, outros jovens como eu.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

ANJOS CABOCLOS



Publicado no Jornal Letras Santiaguenses jan/fev 2010

Paródia da música Faroeste Caboclo, do Legião Urbana

Não tinha medo o tal João de Santo Cristo
Era o que todos diziam quando ele se converteu
Deixou pra trás todo o marasmo da fazenda
Só pra sentir no seu sangue o amor que Jesus lhe deu
Quando criança só pensava em amar Cristo
Ainda mais quando com um resgate de soldado o pai viveu
Era o amor da cercania onde morava
Na escola até o professor com ele aprendeu
Ia pra igreja só para doar dinheiro
As velhinhas o colocavam na caixinha do altar
Sentia mesmo que era mesmo diferente
Sentia que deveria profetizar
Ele queria sair pra ver o mar
E as coisas que ele via na televisão
Juntou dinheiro para poder viajar
De escolha própria escolheu ser ermitão
Catequizava todas as menininhas da cidade
De tanto ensinar aos doze era professor
Aos quinze foi mandado pro seminário
Aonde aumentou sua compaixão diante de tanto terror:
Não entendia como a sua vida funcionava
Discriminação por causa da sua classe, sua cor
E não cansou de tentar achar resposta
Comprou uma passagem, foi pregar em Salvador
E lá chegando foi tomar um cafezinho
Encontrou um boiadeiro com quem foi falar
O boiadeiro tinha uma passagem
E ia perder a viagem, mas João foi lhe salvar
Dizia ele: Estou indo pra Brasília
Nesse país lugar melhor não há
Tô precisando visitar a minha filha
Eu fico aqui e você vai no meu lugar.
Com compaixão, aceitou sua proposta
E num ônibus entrou no Planalto Central
Ele ficou bestificado com a cidade
Saindo da rodoviária viu as luzes de Natal
Meu Deus que cidade linda
No Ano Novo eu começo a trabalhar
Cortar madeira, aprendiz de carpinteiro
Ganhava quase mil por mês em Taguatinga
Na sexta-feira ia pra Igreja da cidade
Doar seu dinheiro de rapaz trabalhador
E conhecia muita gente interessante
Até um neto flagelado de seu bisavô
Um peruano que vivia na Bolívia
Com muito amor vinha de lá
Seu nome era Pablo, ele dizia
Um projeto ele ia começar
E Santo Cristo até a morte trabalhava
E o dinheiro só dava pra se alimentar
E ouvia às sete horas o noticiário
Que sempre dizia que o seu bispo ia ajudar
Mas ele não queria mais conversa e decidiu que
Pablo, ele ia ajudar
Elaborou mais uma vez seu plano santo
E sem ser crucificado, a missão foi começar
Logo, logo os fiéis da cidade souberam da novidade
_Tem bagulho bom aí!
E João de Santo Cristo ficou feliz
E acabou com todos os ateus dali
Com amigos, evangelizava na Asa Norte
E ia pra festa de Deus, pra se libertar
E de repente
Sob uma boa influência dos garotinhos da cidade
Começou a perdoar
Já no primeiro perdão ele gostou
E pro céu ele foi pela primeira vez
Paz e respeito do seu corpo
_Vocês vão ver, Jesus ama vocês
Agora o Santo Cristo era um mito
Querido e amigo no Distrito Federal
Não tinha nenhum medo de satã
Pagão ou anticristo, assassino ou animal.
Foi quando conheceu uma menina
E de ser padre ele se arrependeu
Maria Lúcia era uma menina linda
E o coração dele
Pra ela o Santo Cristo prometeu
Ele dizia que queria se casar
E carpinteiro ele voltou a ser
_Maria Lúcia pra sempre eu vou te amar
E um filho com você eu quero ter
O tempo passa e um dia vem à porta um senhor de alta classe com dinheiro na mão
Ele faz uma proposta indecorosa e diz que espera uma resposta
Uma resposta de João
_Não boto o nome de Deus em vão ou excomungo em colégio de criança
Isso eu não faço não
E não beatifico general de dez estrelas, que fica atrás da mesa
Com o diabo na mão
E é melhor o senhor sair da minha Igreja
Nunca brinque com um sacerdote descendente de São João
Mas antes de sair, com ódio no olhar, o velho disse:
_Você perdeu a sua vida sacristão
Você perdeu a sua vida sacristão
Você perdeu a sua vida sacristão
Essas palavras vão entrar no coração
E eu vou sofrer as conseqüências como um cão
Não é que Santo Cristo estava certo
E seu futuro era incerto e ele não conseguiu rezar
Ele chorou e no meio da choradeira descobriu que tinha outro
Rezando em seu lugar.
Falou com Pablo que queria um parceiro
E também tinha respeito e queria lhe ajudar
Pablo vendia escapulários da Bolívia e Santo Cristo revendia em Planaltina.
Mas acontece que um tal de Jeremias
Bispo de renome apareceu por lá
Ficou sabendo dos amores de Santo Cristo
E decidiu que João ia confessar.
Mas Pablo trouxe uma Bíblia, pois
Santo Cristo já sabia confessar
E decidiu usar a Palavra só depois
Que o Jeremias lhe pedisse pra confessar.
O Jeremias, bispo da Polônia, organizou as confissões
E fez todo mundo orar
Catequizava mocinhas inocentes
E dizia que era crente, mas não sabia rezar.
E Santo Cristo há muito não ia pra casa
E a saudade começou a apertar
Eu vou rezar pra Maria Lúcia
Já é tempo da gente se casar
Chegando em casa, então, ele rezou
Mas pro céu não teve segunda vez
Maria Lúcia, Jeremias catequizou
E uma reza com ela ele fez
Santo Cristo era só tristeza por dentro e então o Jeremias para uma reza ele chamou
Amanhã às duas horas na Ceilândia, em frente à igreja, é pra lá que eu vou
E você pode escolher os seus terços que eu escolho a bíblia, seu fajuto pastor
E converto também Maria Lúcia, aquela menina ateia pra quem jurei o meu amor.
Santo Cristo não sabia o que fazer
Quando viu o repórter na televisão
Que deu a notícia da vigília na TV
Dizendo a hora, o local e a razão
No sábado então, às duas horas, todo o povo
Sem demora foi lá só pra assistir
Um homem que professava pelas costas, converteu o Santo Cristo
E começou a sorrir
Sentindo o sangue na garganta
João olhou pros anjinhos e pro povo a aplaudir
E olhou pro sorveteiro e pras câmeras e
A gente da TV que filmava tudo ali
E se lembrou de quando era uma criança e de tudo o que vivera até ali
E decidiu entrar de vez naquela dança
_Se a via-crúcis virou circo, estou aqui
E nisso o sol cegou seus olhos e então Maria Lúcia ele reconheceu
Ela trazia a bíblia e mais dois,
Escapulários que seu primo Pablo lhe deu.
_Jeremias, eu sou cristão, coisa que você não é
E não professo pelas costas não
Olha pra cá seu bispo, sem oração
Dá uma olhada no meu sangue
E vem sentir o meu perdão.
E Santo Cristo com o escapulário, depois
Excomungou o bispo impostor
Maria Lúcia se arrependeu depois
E orou junto com João, seu protetor.
E o povo declarava que João de Santo Cristo era santo porque sabia viver
E o alto Clero da cidade não acreditou na história que eles viram na TV
E João não conseguiu o que queria quando veio pra Brasília, com Deus ter
Ele queria era falar pro presidente
Pra ajudar toda essa gente
Que só faz
sofrer.

Protegido