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sábado, 30 de março de 2024

Protegido

O bullying dos corredores e da sala de aula eram esquecidos depois que adentrava nos reinos das histórias de ficção. 

A biblioteca era o seu castelo de proteção.


segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Um planeta chamado Biblioteca



Há um planeta muito lindo, com pessoas como nós, animais e plantas que falam, fantasmas, dinossauros e muitos outros seres da nossa imaginação. Um mundo que pode ser tanto belo quanto horroroso, nos encantar ou decepcionar, causar calafrios ou despertar paixões. Ou então, tudo isso junto. Creio que você já tenha visitado pelo menos uma vez na vida esse planeta, mesmo que nem lembre quando. Mas, de acordo com a pesquisa “Retratos da leitura no Brasil”, divulgada em 28 de março, para 75% da população, esse planeta chamado Biblioteca ainda é novidade.
A mesma pesquisa ainda relatou que a média de leitura do brasileiro é de 2,1 livros por ano. Isso que foram contados os lidos pela metade! Em 2007, a mesma pesquisa havia sido realizada e a média fora de 4,7. Números baixinhos, principalmente porque validaram livros didáticos, que encorpam significativamente essas estatísticas.
Além de a nossa cultura ser mais propensa à televisão que ao livro, à novela que ao romance, a miserabilidade enterra as esperanças de desenvolver o gosto pela leitura. Quem luta diariamente para conseguir uma refeição diária, uma roupa que proteja do frio, uma tábua que cubra o telhado da chuva, que perspectiva terá em investir dois reais num periódico? Quem será negligente com a família ao investir dez reais numa revista, se isso pode ser convertido no seu almoço?
Resta à escola, primordialmente nas áreas mais carentes - mas não unicamente nelas - o papel de apresentar o Planeta Biblioteca a seus discentes. Resta fazer despertar o gosto pela leitura e procurar criar ferramentas que envolvam os pais a participarem dessa construção do conhecimento com seus filhos, a mostrar aos progenitores ou responsáveis que novas perspectivas podem surgir através da leitura. Não é uma tarefa fácil acordar na criança o desejo pelas letras, a curiosidade por saber mais, a vontade de estar sempre em contato com o conhecimento. Mas é necessário.
Muita gente assistiu ou assiste à minissérie Gabriela. Mas, comparando, pouca gente leu Gabriela. Porque grande parte das pessoas gosta de novelas, filmes ou seriados, mas tem pavor de ler. Novela é uma comida mais pronta, já mastigada, não exercita muito a imaginação, mas também é história. Por vezes é a mesma história de livro homônimo. Arrisco a dizer que nunca é tão boa quanto a impressa. Então, onde parou ou por que não começou a vontade de ler?
O Ministério da Cultura, um mês após a divulgação daqueles números tristes do começo do texto, informou o investimento de 373 milhões no Plano Nacional do Livro e da Leitura. “Um brasileiro que lê cresce mais, e o Brasil cresce junto”, palavras da Ministra da cultura, Ana de Hollanda. Esse programa prevê a modernização e construção de bibliotecas.
Quem sabe se no futuro o índice de 75% que não conhecem biblioteca diminua. Quem sabe se a média de livros lidos ao ano volte aos 4,7, torne-se seis ou, algum dia, 10? Esses índices são possíveis, sim. E nem a tão longo prazo. Basta vontade de quem administra as cidades, estados e o país. Mas, principalmente, empenho dos pais e da escola para despertar o desejo pelas palavras.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

TAPA DE LUVA DE PELICA

Publicado no O Jornal de Uruguaiana, em 21 julho 2010

Não sei quando surgiu a expressão “tapa de luva”, mas foi muito bem bolada. Se empregada oportunamente, consegue exprimir com exatidão o que outras palavras não conseguiriam com tanta eficiência. Pois foi esse “tapa suave” ou “com classe” que presenciei pouco tempo atrás. E constantemente flagramos tapas desse naipe ocorrendo. Talvez não notemos, assim como meu avô não percebeu recebê-lo.

Quando mais novo e responsável pela educação de minha mãe e seus três irmãos, ele jamais os apoiou em quaisquer atividades que seja. A família era uma entidade que provavelmente pesava nas suas costas, mas certamente era quem lhe dava um pouco de conforto e sustento. Era alcoólatra e suas bebedeiras refletiam na esposa e nos quatro filhos: distanciamento, perda de qualquer demonstração de carinho e respeito, medo. Total desestrutura familiar. Assim como ele, milhares de famílias sofrem esse drama, hoje ainda.

Na suas pobres ignorâncias de trabalhadores braçais, ele e minha avó nunca puseram um livro nas mãos de seus filhos. Pelo contrário. Recomendavam que não lessem, pois era bobagem, tempo perdido. Infelizmente, essa realidade também não sumiu com o passar dos anos. Minha mãe lia os poucos livros que tinha acesso escondida, entricheirada no seu quarto. Sumia com os volumes literários debaixo da cama assim que ouvia algum rumor. Chegava a ensaiar como fazê-lo, tal era o medo de represálias. Ironicamente, hoje ela é professora de Língua Portuguesa e a principal responsável pelo meu gosto pelo mundo da escrita. Mas esse não é o tapa de luva. Ele vem logo abaixo, também devido a uma ironia do destino.

As bebedeiras de meu avô diminuíram e as monossilábicas palavras de outrora foram substituídas por longos diálogos. Atualmente ele não perde um encontro de família, visita todos que pode e conversa, parecendo uma caturrita. Numa dessas visitas, passou lá em casa e por coincidência, no dia seguinte chegaram os exemplares da antologia que eu e minha mãe participamos, cada um com um conto.

Ele pousara lá e os exemplares chegaram durante a tarde. Antes que eu chegasse em casa para vê-los, meu avô já os havia pego, guardado consigo e retornado a São Borja, cidade que reside. Levara um jornal literário com contos e crônicas e um livro com um conto, todos de sua filha. A mesma que lia escondida, apreensiva caso ele visse. Mas dessa vez ele não brigara com ela. Pelo contrário, abrira um largo sorriso ao saber da existência do jornal e do livro, orgulhoso do sangue do seu sangue.

Levara um “tapa de luva”, de luva de pelica e, provavelmente, nem tenha notado. Recebera uma lição de vida aos 71 anos e talvez não tenha consciência disso. Mas certamente saiu feliz pelo sucesso da filha, independente de perceber que ela superou a sua reprimenda, prosseguiu lendo e começou a escrever.

A dificuldade encontrada para ler não é um caso isolado. Basta olharmos um pouco para nosso umbigo. Uruguaiana sofre todos os anos para conseguir ter uma feira do livro. Muita gente fica sem saber. Quem ouve falar, não vai. Meia dúzia de leitores prestigiam-na e ela permanece às moscas. Claro que o preço de um livro custa muito caro para uma família que mal consegue alimentar-se. E na disputa entre refeição e leitura, o papel perde com facilidade. Mas, também, em casa as crianças são pouco estimuladas a ler.

Quando o acesso ao mundo literário é possível, que é o caso da escola, o aluno tem o direito indissociável de entrar em contato com as histórias infantis. Contudo, ainda que aprenda a ler e escrever no colégio, é muito importante ouvir histórias das bocas dos seus pais. Para que não surjam histórias como essa. Até porque tapas de pelica não são tão comuns no dia-a-dia.

Protegido