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domingo, 22 de junho de 2014

ILUSÕES COLETIVAS

Há anos que deixei de acreditar em muitos ideais coletivos. Antes me pareciam bonitos, empolgantes e os desejava alcançar. Mas essas utopias descortinaram-se como boas desculpas para as pessoas venderem mais, distrair multidões ou justificar chacinas.

Após anos de trabalho no Exército Brasileiro
O que ouvi: defender a pátria com o sacrifício da própria vida.
O que penso: desde que o salário gordo esteja na conta.

Os salários astronômicos dos jogadores de futebol contrastam com a falta de incentivo ao esporte do Brasil
O que ouço: rumo ao hexa.
O que penso: isso não vai mudar em um centavo o meu salário, nem nada na minha vida, tampouco na vida daqueles que poderiam ter o esporte como perspectiva de crescimento profissional.

A preocupação com o meio ambiente tem crescido nos últimos anos e alguns discursos mal-intencionados parecem buscar a sustentabilidade, mas a intenção é outra
O que ouço: se cada um economizar um pouco de água vai ajudar o meio ambiente.
O que penso: essa economia não é relevante enquanto imperar a obsolescência programada e grandes empresas poluírem desrespeitando leis e recebendo multas irrisórias.

Existe a América do Sul, a América Central e a América do Norte. Todos que nela moram são americanos. Nenhum dos povos pode considerar-se unicamente como americano
O que ouço: os americanos.
O que penso: eu sou americano (ou sul-americano, ora bolas). Também existem os norte-americanos.

A falsa luta contra homens-bomba esconde a intenção gananciosa de roubar petróleo do Oriente Médio e manter aquecida a indústria bélica norte-americana
O que ouço: guerra ao terror.
O que penso: desculpa norte-americana para subjugar outra nação e roubar o seu dinheiro.

Há muito pseudo-moralismo e agora é modinha reclamar da política. Passar a perna, superfaturar pequenas obras também é corrupção. A esses, falta apenas se elegerem.
O que ouço: políticos corruptos.
O que penso: políticos corruptos e povo corrupto.

Ideais coletivos não atendem fidedignamente ao que pensa a coletividade, pois cada um interpreta o seu mundo e cria as suas verdades. Há uma generalização do que se pensa, superficializando os conceitos, relativizando tudo, são ilusórios.
Essas utopias romantizam o que nem é tão belo, valem-se de apelações baratas e atendem a interesses capitalistas que geralmente são escusos. Por todos esses argumentos, não acredito mais nelas. Elas não me enganam mais.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

A FESTA QUE É PARA POUCOS

Publicado no O Jornal de Uruguaiana de 30 jun 10

Mais certo que previsão do tempo foi dizer duas semanas atrás aqui neste espaço que a Copa do Mundo é o melhor espetáculo para fazer o povo esquecer tudo e os políticos iniciarem a festa. Usava o computador e olhava de relance o que passava na televisão. Nenhuma novidade: vuvuzelas, estatísticas de classificação das equipes no mundial e outras tantas análises dos jogos. Era dia 23 de junho. Eis que ouvi a notícia do Jornal Nacional: Senado aprova aumento médio de 25%. Falta aprovação da Câmara e sanção do Lula. Se tudo isso ocorrer antes do dia 2 de julho, passa a valer para esse ano. E como não poderia ser diferente, depois dos intervalos, mais Copa do Mundo.
Nada contra a festa do futebol. Mas tudo contra a não cobertura dos fatos que REALMENTE interferem no nosso dia-a-dia. Porque a seleção brasileira ganhando a Copa não garantirá o meu emprego nem me dará bonificação por “entusiasta torcedor”. Mas um aumento de 217 milhões de reais nas despesas do Senado ainda em 2010 e R$ 464 milhões para o ano que vem dizem-me respeito. E não só a mim, mas a todo contribuinte e seus dependentes, porque é dinheiro público que está para ser subtraído dos cofres da União e engordar o contra-cheque do funcionalismo da Casa.
Palavras do site da Folha de São Paulo do dia 23 de junho “Com agilidade incomum, Senado aprova reajuste a servidores com impacto de R$ 464 milhões”. Coincidência ou não, agilizou-se um aumento durante a Copa do Mundo... que novidade! Incomum seria se o Legislativo aprovasse o aumento do mínimo durante a Copa. Lá no País das Maravilhas da Alice, ou na Terra do Nunca, do nosso amigo Peter Pan, quem sabe um dia haverá a notícia “Com agilidade incomum, Senado aprova reajuste a professores”, “Câmara dos Deputados aprova a diminuição da carga tributária em votação relâmpago”, ou algo assim. Um pensamento um tanto utópico, não?
Está ocorrendo uma terrível enchente no Nordeste, leis desfavoráveis ao povo são votadas, outras problemáticas ocorrem e o que é noticiado? O que permeia as rodas de conversa? O som estridente das vuvuzelas, a queda da França na primeira fase do mundial, o primeiro cartão vermelho do Kaká pela seleção brasileira.
Cedendo a pressões dos seus servidores, o Senado aprovou o reajuste reformulando o plano de carreira de seus concursados e comissionados. O que mais me assusta é a urgência com que tudo está ocorrendo. E o desconhecimento da população sobre o ocorrido. Já não surpreende a cara-de-compensado de senadores como o Sr. Heráclito Fortes (DEM), relator da proposta, que diz "Tínhamos uma reserva orçamentária em torno de R$ 300 milhões. Estamos economizando, portanto, R$ 100 milhões" (site da Folha de São Paulo, 23/06/10). Ora, é realmente urgente reajustar os gastos no Senado: atualmente a folha de pagamento anual bate a casa dos R$ 2,2 bilhões!
Já dizia a música “Perfeição”, da Legião Urbana: “Vamos celebrar a estupidez humana, a estupidez de todas as nações; o meu país e sua corja de assassinos, covardes, estupradores e ladrões”. Vamos celebrar o pão e circo da Copa do Mundo e deixar os ladrões aumentarem os seus salários...
Não sou nenhuma espécie de cientista político, mas peço que a mídia dê mais valor a esses absurdos que ocorrem com as pessoas que definem os rumos do nosso país. Um pouco menos de Bafana Bafana e um pouco mais de realidade. E, senhores leitores, não sejamos ingênuos em achar que quando todas as atenções estão voltadas para fora do Brasil, não haverá festa aqui também. Ela ocorre, mas não estamos na relação de convidados.
(CURIOSIDADES DA COPA: O Senado aprovou, também, no dia 17/06/10, projeto que reajusta salários de mais de 30 mil funcionários de órgãos federais).

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

A PRIVATIZAÇÃO PRISIONAL

Publicado no Jornal Letras Santiaguenses jul/ago 2009

O Brasil já escolheu suas cidades-sede para a Copa de 2014. Agora começa a luta na busca por investidores privados. Gigantes como Itaú, Castrol e Continental já têm os contratos acertados com a FIFA. É o dito planeta-bola que movimenta bilhões Brasil afora. Concomitante a este relevante acontecimento, diversas problemáticas desenrolam-se no nosso Estado. Claro que não têm o brilho de um Mundial, nem parcerias milionárias, mas os problemas são muito mais complexos. Como a desesperante crise nos presídios deflagrada no Rio Grande do Sul.
A Polícia Civil cumpriu no final de maio 15 mandados de busca e apreensão em Canoas. Setenta agentes da polícia participaram. Era a culminância da Operação Tentação, que terminava após meses de investigação. Uma quadrilha de furto de caminhões do montante de 98 veículos. Até então, mais uma operação bem-sucedida pela polícia. Graças a Deus. Felizmente. Mas eis que o juiz da 4ª Vara Criminal de Canoas indeferiu o pedido de prisão preventiva desses malfeitores. O motivo: os presídios estão lotados e não há lugar para a quadrilha. Pois então a solução é manter toda a articulação criminosa solta, livre para permanecer com sua empreitada ilícita?
Todos esses fatos elucidam a precariedade de nosso sistema prisional. Não há uma política clara de reformulação dos presídios e da sistemática de ressocialização do apenado. Porque preso não vota, não elege político. É uma massa jogada entre quatro paredes, a escória da sociedade que a mesma faz questão de esquecer, ignorar e repudiar sempre que pode. Não há movimentação para transformar os apenados em mão-de-obra, em peças de reestruturação social. Porque não há um eficiente trabalho de reinserção na sociedade. Uma população fadada ao sol quadrado, desocupada, empilhada em presídios cheios e onde dormem ladrões de galinha e assassinos juntos; enquanto bandidos afortunados molham as mãos de advogados, juízes e driblam as leis com a mesma facilidade que Nilmar avança pela defesa adversária e marca um gol.
Os presídios nada mais são que um local onde quem é tido como impróprio para o convívio fica jogado e esquecido. Temos no estado quase 37 mil presidiários dos regimes aberto, semiaberto e fechado. As cadeias estão superlotadas há muito tempo e são muito precários os serviços de assistência médica, psicológica e educacional. O que ocorre então? Os detentos permanecem a maior parte do tempo desocupados. E mente ociosa é a mente do diabo.
O estado inicia um debate sobre uma solução, ao menos paliativa, de privatização do sistema carcerário. Um assunto polêmico que apresenta muitos prós e contras. O debate se estenderá por muito tempo e alguma solução será tomada. Que seja a melhor. E mesmo que não seja, é melhor que manter tudo como está.
Na edição de 13 de junho de 2009, de Zero Hora, uma reportagem especial encarrega-se de detalhar como se dá essa polêmica. Praticamente um porta-voz do SIM à privatização das cadeias, o Secretário Estadual de Planejamento e Gestão, Mateus Bandeira, apoia-se na ideia de que se o Estado não pode resolver o problema devido à burocracia e entraves políticos, a iniciativa privada pode. Experiências positivas nos Estados Unidos, Chile e em Joinville, Santa Catarina, são outros bons argumentos. O projeto que deverá ser proposto ao governo gaúcho é composto por um complexo de mais de três mil vagas, um custo médio de 2200 reais por detento, 27 anos de contrato, alimentação, assistência médica, odontológica e social, atendimento jurídico e psicológico, ensino fundamental, médio e profissionalizante, instalação de oficinas de trabalho, uniformes e segurança. Uma proposta tentadora que pode reduzir com muita rapidez o déficit atual de mais de 10 mil vagas. Seriam menos presos empilhados. Um pouco mais de humanidade.
CONTRA essa proposta, o Ministro da Justiça, Tarso Genro, defende que é um papel constitucional do Estado o dever de abrigar os apenados. Pesa a perspectiva de seguranças privados realizarem a segurança interna, papel que cabe, hoje, à SUSEPE. O objetivo da empresa gestora passará a ser, então, o lucro, princípio básico da iniciativa privada, e não a recuperação e ressocialização do preso. Isso é uma mudança não desejável de objetivos na operação de um presídio. O custo de cada preso sobe com a participação da iniciativa privada. Passa de R$600,00 para R$2250,00. Contra-balança com esses números a estatística de 10 vezes menor reincidência em presídios de administrações privadas. Uma compensação pelo custo mais elevado. E o tamanho do estabelecimento penal, segundo o Ministro, é superior às recomendações internacionais, que preveem presídios de cerca de 450 presos.
O Estado luta para conseguir construir novos presídios. Empresas privadas tentam incluir-se nessa iniciativa. A população não-carcerária reclama que algo deve ser feito. Porque a carcerária há anos reivindica e não é ouvida. Briga-se por alguns milhões que possibilitem distribuir humanamente os detentos que hoje se aglomeram aos montes em minúsculas celas úmidas e sujas. O Governo briga para que desculpas esfarrapadas como as da Justiça de Canoas não sejam mais possíveis. Para que outras quadrilhas de caminhões, grupos de extermínio e demais bandidos sejam presos, tenham lugar onde tenham a possibilidade de serem recuperados para posteriormente retornarem ao convívio social. É um embate muito mais estressante e preocupante que os milhões a serem investidos nas cidades-sede da Copa de 2014. Um problema não tão midiático, por não haver tantos expectadores como no Mundial. Mas é, seguramente, muito mais importante.

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