Mostrando postagens com marcador fukushima. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador fukushima. Mostrar todas as postagens

domingo, 18 de setembro de 2011

Édipo às avessas

Publicado no Jornal da Cidade Online, em 18 Set 2011
“ÉDIPO APARECE, COM A FACE ENSANGUENTADA, TATEANDO EM BUSCA DE SEU CAMINHO". Nesta passagem de Édipo Rei, do teatrólogo grego Sófocles, o protagonista descobrira que matara seu pai e dormira com sua mãe. A culpa foi tão grande que decidiu punir-se, arrancando os olhos e abandonando a cidade onde morava.
No filme “A insustentável leveza do ser”, situado na década de 60, o protagonista Tomas, um médico da cidade de Praga, atual capital da República Tcheca, refere-se ao personagem épico para criticar os políticos que não assumiam a própria culpa e puniam os opositores. Durante a história, o médico é pressionado a mudar sua opinião pelo bem do próprio pescoço.
Os anos de chumbo se foram, mas os políticos pouco mudaram. Depois que os adoráveis deputados estaduais gaúchos aprovaram o vergonhoso aumento dos seus salários em 73% no final de 2010, Tonho Crocco criou o rap “Gangue da matriz”, onde criticou o aumento e citou, nominalmente, alguns parlamentares que votaram a favor. O deputado Giovani Cherini (PDT), à época presidente da Assembleia Legislativa, representou ação junto ao Ministério Público contra Crocco, pois a sua canção ofendia a honra dos deputados. E esse posicionamento afronta a minha tolerância...
Não é de hoje que a vergonha abandonou o caráter das pessoas. Antes de aumentarem o salário no final do ano passado, outras amostras de sem-vergonhice já haviam sido demonstradas pelos políticos em todos os níveis: federal, estadual e municipal.
Invertendo a lógica, a máquina pública não pensa em elevar os salários das classes mais baixas e estancar os vencimentos de quem já recebe muito além do que merece. Tanto é que professores e policiais debatem, historicamente, com governos, melhores condições de trabalho. Definitivamente, o Estado não joga no mesmo time do povo. Porque quando a crise se aproxima, ele sobe o preço dos produtos, aumenta os impostos e engorda a já obeso-mórbida arrecadação estatal.
Reforça essa linha de pensamento, a decisão dos vereadores de Porto Alegre em abocanhar mais um pouco da dignidade do povo - tentaram aumentar os seus salários de 10,3 mil para 14,8 mil reais. Um valor absurdo! Você viveria muito bem com os 4,5 mil reais a mais que queriam receber...
O aumento foi aprovado, mas o Tribunal de Contas do Estado (TCE) suspendeu a infeliz iniciativa dos vereadores. Felizmente!
Gangue da matriz só tentou ser vetado porque cita o nome dos deputados e, sendo música, quem ouve acaba gravando. Lá vão os nomes dos nossos “nobres” parlamentares que votaram a favor:
Do PMDB: Alberto Oliveira, Alceu Moreira, Alexandre Postal, Edson Brum, Gilberto Capoani, Luiz Fernando Záchia, Márcio Biolchi, Marco Alba e Nelson Härter. Do PP: Adolfo Brito, Francisco Appio, Frederico Antunes, João Fischer, Pedro Westphalen e Silvana Covatti. Do PDT: Adroaldo Loureiro, Ciro Simoni, Gerson Burmann, Gilmar Sossella e Kalil Sehbe. Do PSDB: Adilson Troca, Paulo Brum, Pedro Pereira e Zilá Breitenbach. Do PTB: Abílio dos Santos, Aloísio Classmann e João Scopel. Do PPS: Derfran Rosado, Luciano Azevedo e Paulo Odone. Do DEM: Francisco Pinho e Paulo Borges. Do PSB: Heitor Schuch e Miki Breier. Do PRB: Carlos Gomes. Do PcdoB: Raul Carrion.
E sempre é bom destacar aqueles que votaram contra o aumento: do PTB: Cassiá Carpes. Do PT: Adão Villaverde, Daniel Bordignon, Dionilso Marcon, Elvino Bohn Gass, Fabiano Pereira, Ivar Pavan, Marisa Formolo, Raul Pont, Ronaldo Zülke e  Stela Farias.
Os parlamentares são um Édipo às avessas, pois têm o discernimento entre o justo e o injusto, mas não admitem publicamente que é errado aumentar os seus salários. Diferentemente do personagem de Sófocles, jamais arrancarão os olhos devido à consciência pesada. Admiro o primeiro-ministro japonês, Naoto Kan, renunciar quando a sua popularidade caiu depois do tsunami e do desastre nuclear em Fukushima. Fatos assim não geram desconforto nos políticos brasileiros. Infelizmente...

Protegido